Evento: Headline Festival
Data: 26/08/2016
Local: Estelita Bar. Recife/PE
Bandas: - Inner Demons Rise (Death Metal – PE) - Warcursed (Death Metal – PB) - Decomposed God (Death Metal – PE) - Torture Squad (Death/Thrash Metal – SP)
Resenha & Fotos: Valterlir Mendes
Antônio Araújo (antigo guitarrista/vocalista da banda pernambucana ChaoSphere e atual guitarrista do veterano Korzus) se enveredou pelos caminhos da produção de shows e na sua primeira empreitada, o “Headline Festival”, procurou juntar um dos nomes mais conhecidos do Underground nacional com mais três forças do Underground nordestino.
Já ouvi falando que as redes sociais são o termômetro para saber se um evento vai dar certo ou não; se vai ter um grande público ou não. Pelo movimento na página do evento, no Facebook, se esperava que o local designado para o mesmo, ficasse bem cheio.
O local para o evento: Estelita Bar, que recentemente recebeu uma edição do “Visions of Rock”, que teve o Artillery como banda principal. As críticas ao local são diversas, desde a sua localização até os preços e meio de transporte quando se terminam os shows. Havia o fato, também, de o “Headline Festival” ocorrer numa sexta-feira. Ou seja, as reclamações são as mais diversas, mas notei que, dessa vez, não havia muitas reclamações acerca do valor do ingresso.
Como sempre, saí de minha cidade, no interior pernambucano. Viagem tranquila e uma carona muito bem vinda para evitar gastos com passagens ou ter que se locomover de motocicleta, ainda mais indo para conferir um evento regado a muito Heavy Metal. Eventos assim é praticamente impossível se evitar algumas cervejas, mesmo com os valores altos do local.
Cheguei ao Estelita por volta das 19h40, com Alcides Burn (Inner Demons Rise) e Washington Pedro (The Ax). As imediações do local, como percebi da última vez que estive por lá, tem pouca movimentação. É um bairro residencial, sem pontos de venda de bebidas e comidas. Felizmente, dessa vez, os serviços de esgoto da frente haviam terminado (ou quase) e já dava até para ficar mais tranquilamente conversando com o pessoal.
Decidi sair e aguardar no lado de fora, antes de pegar o credenciamento para fazer a devida cobertura. De início fiquei temeroso com o número de pessoas que iriam conferir o ‘fest’ e fiquei imaginando o evento passado, que teve um público muito pequeno. As pessoas chegavam aos poucos, o que não era algo bom... Decidi entrar, imaginando (e torcendo) que poderia pegar fila (já que era necessário apresentar identificação para receber a comanda) e não ver o início dos shows.
Como de praxe, uma pequena demora a ter início os shows, que foram abertos pelo anfitrião Antônio dando as boas vindas ao escasso público que estava no local...
As 21h40 entra em palco o Inner Demons Rise, que vem numa boa sequência de shows, em suporte ao seu ‘debut’ álbum, “In the Name of the Father, and of the Son and Violence. Abrir eventos nunca é uma boa, já que as primeiras bandas sempre tendem a pegar um pequeno e frio público. O início não foi muito bom, já que a sonorização estava muito alta e isso, geralmente, “embola” a parte instrumental da banda. Foi exatamente o que se ouviu na música de abertura (após uma “Intro”), “MEV-I”. Na segunda música, faixa-título do ‘debut’, a sonorização melhorou um pouco, apesar de ainda não ser a ideal. Ao menos as guitarras de Alejandro Flores e Miguel Dantione estavam bem audíveis, o que é essencial, já que elas ditam o andamento das músicas, com boas melodias e solos sempre contagiantes, fazendo com que o Death Metal praticado pelo Inner Demons Rise tenha certa diferenciação. A bateria, dessa vez suspensa e não na mesma altura que os demais músicos, também merece menção, já que David Souza simplesmente aniquilou o instrumento, tanto nas levadas mais rápidas e retas, como nas partes mais ‘quebradas’ e que, por vezes, chegaram a ditar alguns andamentos. Não se pode deixar de falar do baixo empunhado por Marcelo Santa Fé, que mesmo tendo sofrido com a equalização, é de grande importância para manter a sonoridade encorpada. Em meio as músicas do ‘debut’, veio “Humanimal”, música nova que já vem fazendo parte dos shows da banda. Mas antes de ser tocada, o vocalista Alcides Burn fez um agradecimento ao “patrono” da festa. No show anterior do Inner Demons Rise, que também pude prestigiar, houve um problema na guitarra de Alejandro. Dessa vez quem teve problemas foi Miguel, mais precisamente na música “I See Evil”. O instrumento simplesmente parou, voltando um tempo depois, mais ‘microfonando’ muito. Essa música, sempre que oportuno, conta com a presença de Wilfred Gadêlha (Will2Kill) dividindo os vocais com Alcides. O fim viria com “Beneath the Suffering”, já com o som mais bem equalizado e tudo bem definido, mas ainda houve tempo para que a banda mandasse “Arise” do Sepultura, que encerrou um show de exatos 32 minutos.
Ajustes de palco, sempre que termina um show, sempre ocorrerão e, nesse caso, seria preciso, para que o som viesse com maior qualidade nas próximas atrações. Então fui dar uma volta no pequeno, mas aconchegante Estelita e a essa altura o público já havia aumentado consideravelmente, e notei que não parava de chegar, alguns já reclamando da espera na fila...
Foram cerca de 30 minutos de ajustes e por volta das 22h45 a banda paraibana Warcursed começava a sua apresentação. Desde a sua criação, com o nome PostMortem, a banda passou por diversas formações, e eu praticamente vi shows com todas elas. Nesse show a banda foi: os irmãos Marsell (bateria) e Richard Senko (vocal/guitarra), Eduardo “Dudu” Esvb (guitarra) e Dmitry Luna (baixo). Apesar de novas mudanças nos vocais, Richard não inventou muita coisa e preferiu seguir as linhas já feitas nos seus dois discos. Mesmo não sendo os mesmos vocalistas, as linhas vocais ficaram bem próximas, ou seja, uma mescla entre grave, doses guturais e algumas passagens mais ríspidas. A musicalidade da banda, apesar das mudanças na formação, continua intacta, com aquele Death Metal técnico, com boa dose de melodias, principalmente nos solos e riffs de guitarras, além de bem inseridas bases Thrash Metal. Em palco, apesar do pouco tempo da formação tocando junta, uma boa sincronia e bastante movimentação. Vale ressaltar que no show do Warcursed a sonorização deu uma melhorada considerável e o público bem maior, não lotando o local do palco, mas com um número quase satisfatório, e já começando a agitar. Como não poderia deixar de ser, o ‘set’ foi baseado nos dois discos da banda, e pudemos ouvir/ver a banda detonando com “Superior Tiranny”, “Deadline” e “The Last March”. Entre as velhas músicas, temas mais novos, que mesmo trazendo algo de peculiar da música do Warcursed, flertam com a velocidade do Thrash Metal e até mesmo do Hardcore, mostrando uma nova faceta da banda. Foi isso que o público pode presenciar em “Pallor Mortis” e “Decomposition”. Richard, agora como ‘frontman’, vem se soltando (apesar da repetição de palavrões – risos) e mostrou bastante segurança, tanto nos vocais como na guitarra (o que ele já fazia muito bem outrora). O show foi contagiante e chegou até a abrir algumas rodas de mosh nas músicas mais velozes. Uma apresentação do Warcursed é sempre muito bom de se poder ver, já que energia é o que não falta no palco.
Mais um tempo para novos ajustes de palco. Valendo salientar que as três primeiras atrações fizeram uso de uma mesma bateria. Mesmo assim, os ajustes não demoravam menos que 30 minutos.
Passava um pouco da meia-noite e uma das mais importantes bandas do Underground do Nordeste seria a próxima atração. O Decomposed God, desde o seu nascimento, em 1994 (quando adquiriu o atual nome), já passou por diversas formações, mas sempre manteve uma base, ou seja, Marco Antônio (guitarra) e seu irmão Jean Marcel (baixo), além do baterista Wagner Oliveira. Na linha de frente, já faz um tempo, Luiz Boeckmann, também conhecido como Luizão Tattoo, que empunha o microfone nessa nova fase da banda. Nova fase, mas com um ‘set list’ baseado nos velhos clássicos da banda, afinal o último disco de estúdio do Decomposed God, “Bestiality”, foi lançado em 2008. Eu havia visto a banda com essa nova formação ano passado, no “Hellcife Fest”, mas, na oportunidade, a mesa não conseguiu deixar o show dos pernambucanos numa boa qualidade. Dessa vez a sonorização estava num bom patamar, apesar de o som da banda ficar um pouco ‘vazio’ em algumas passagens, já que alguns clássicos pedem duas guitarras. Mesmo assim Jean segurou bem essa lacuna, ainda mais acompanhando o sempre brutal Wagner. Descrever o Death Metal do Decomposed God é algo meio complicado, já que a banda, mesmo com os vocais cavernosos de Luizão, sempre traçou um caminho bem peculiar. O público, talvez em sua totalidade nesse momento, agitou bastante, e foi para frente do palco. A postura (e presença aterradora) de Luizão ajudava a passar muita energia, vale dizer. Mesmo que de forma tímida, as rodas se formavam, e ir para frente, para tirar fotos, não era tarefa nada fácil. Além de músicas do “Bestiality”, entre elas “No Gods”, “Misanthropic Minds” e “Bestiality”, não poderiam faltar temas do “The Last Prayer”, lendário primeiro álbum da banda. Dele vieram temas como “Impregnated God of Lies” e “Ecce Homo”. Teria ficado interessante ver um dos guitarristas que gravou esse disco dando uma ‘palhinha’, já que Alejandro “Tite” Flores estava por lá. Seria bem interessante mesmo... E nas músicas mais antigas era que o público se empolgava. Inclusive os vocais de “Dawn of Celestial Shadows” foram divididos com o público, mais precisamente com Alcides Burn, que se mostrou bem empolgado com essa música, em particular. O final, com “Hipocrity Liars”, uma das músicas mais emblemáticas do Decomposed God, serviu para fechar mais um show memorável dessa entidade do Underground pernambucano.
Eu falei sobre as primeiras bandas tocarem com a mesma bateria e, mesmo assim, havia um bom tempo para determinados ajustes no palco. A banda principal do festival já estava com uma bateria separada apenas para ela. Então, assim, para desmontar a bateria usada pelas três primeiras bandas e arrumar uma nova, levou um tempo considerável. Creio que cerca de uma hora, não sei ao certo, pois não cheguei a marcar tal parada. Então foi tempo para tomar mais algumas cervejas, dar uma volta no local, conversar com diversos amigos presentes, alguns que fazia tempo que não via e até mesmo poder trocar ideias com o Lourenço Sant’Anna, baterista da banda brasiliense BlackSkull, que havia tocado na capital pernambucana alguns dias antes e que permaneceu por lá, aproveitando para ir conferir o “Headline Festival”. A parte de merchandise estava bem diversificada, com praticamente todas as bandas que fizeram parte do ‘cast’ com material para venda, além de outros souvenirs.
Já passava das 02h00 da manhã e mesmo antes de o Torture Squad dar início a sua apresentação, a área do palco estava praticamente tomada, com muitos se apertando em frente ao palco para ver de perto essa nova formação da banda que, além de Amílcar Christófaro (bateria) e Castor (baixo), conta com Rene Simionato (guitarra) e Mayara “Undead” Puertas (vocal). A última vez que eu havia visto o Torture Squad foi no Abril Pro Rock de 2011 (lá se vão cinco anos!), ou seja, ainda com Vitor nos vocais. Não cheguei a ver a formação com André Evaristo nos vocais e quando a banda tocava como trio. Fazer comparativos é injusto, apesar de Rene se sair muito bem e segurar com total eficácia a barreira sonora produzida por sua guitarra. Claro, a música do Torture Squad é feita para ser eficiente e é composta para uma guitarra, haja vista Castor pegar pesado nos graves de seu baixo, e com a equalização sonora soando deveras ótima, tudo estava muito bem encaixado. Falar sobre Amílcar é praticamente desnecessário, pois quem já conhece o Torture Squad e o que o baterista faz em estúdio, sabe muito bem o que esperar. Velocidade, agressividade, técnica... Mas não pensem que a banda é apenas perfeita em palco. Além de fazer uma ‘sonzeira de responsa’, as suas músicas e postura em palco transmitem bastante ‘feeling’, energia, que contagiam o público de forma esplendorosa. O público agitou praticamente todo o show, batendo cabeça, no mosh, alguns stage diving/surfing crowds, além de se esgoelar nos velhos clássicos. Velhos clássicos que agora tem uma nova vocalista que não poupou a garganta a os jogar, de forma violenta, para os bangers presentes. Mayara assumiu uma grande responsabilidade e mostrou que não está para brincadeira. Ela dosa bem entre agressividades, partes ríspidas/gritadas e guturais bem encaixados, tanto nos velhos clássicos, como “Pandemonium” e “Horror and Torture”, como nas novas, “Return of Evil” (essa, de forma óbvia, abriu o show) e “Swallow You Reality”. Mostrou boa técnica em alguns temas mais marcados, pesados, como “Raise Your Horns”, que ganhou forte ajuda dos presentes na hora do refrão, e “Mad Illusions”. Até mesmo nas músicas contidas em “Esquadrão de Tortura”: “Pull the Trigger” e “No Escape From Hell”, Mayara chamou a responsabilidade e inseriu uma cara mais própria e agressiva a ambas as músicas. A banda fez um ‘set’ contagiante, que englobou toda a sua discografia. Quase que isso não ocorre, já que a última música do ‘set’ seria “Chaos Corporation” (definir o caos que ficou a pista nesse som é praticamente impossível). Mas a banda voltou para o bis e executou “The Unholy Spell”, do disco de mesmo título. Um show cheio de energia, onde banda e público estavam na mesma sintonia. Agitação tanto em cima (não tão em cima), como no lado de baixo do palco.
Acho que beirava as 04h00 da manhã quando o ‘fest’ terminou, novamente com Antônio agradecendo ao público de forma bastante entusiasmada e feliz com o público, que pode não ter lotado o local, mas que compareceu em bom número, apesar das reclamações com a localização do Estelita e o dia da semana. Mas é aquela coisa: quem quer conferir e apoiar o Heavy Metal nacional, o que é feito no Underground, não inventa desculpa ou dar suporte apenas na internet. Vai lá e apoia! Uma coisa é certa: todos saíram bastante satisfeitos! Que venham novas edições!