Evento: Samonios Fest 2016 (Shows, Simbologia Pagã & Cultura Underground)
Data: 29/10/2016
Local: Burburinho Bar (Piso Superior) – Recife Antigo. Recife/PE
Bandas: - Demoniah (Death ‘n’ Roll – PE) - Necro (Hard/Psych/Prog Metal – AL) - Soturnus (Death/Doom Metal – PB) - Son Of A Witch (Stoner/Doom Metal – RN)
Resenha & fotos por Valterlir Mendes
A nova produtora Underground da capital pernambucana, Paganus Prod., decidiu colocar a ‘mão na massa’ e, de cara, anunciou logo três eventos, todos para este ano de 2016, ainda. O primeiro deles levou o título de “Samonios Fest”.
Antes mesmo da realização do evento, em si, a produtora trabalhou bastante o lado de divulgação nas redes sociais, inclusive fazendo algumas promoções para atrair o público, não só da capital pernambucana, mas, também de outras cidades e estados.
A imprensa, credenciada, recebeu diversas informações, sobre horários... O cronograma foi nos entregue de forma bem detalhada. Infelizmente, como saio do interior, acabei chegando atrasado para o credenciamento, que estava marcado para ter início as 19h30. Mas, sem maiores problemas, fui cordialmente recebido e me foi entregue caneta, bloco para anotação, crachá... E não só isso, já que a produção também disponibilizou água e até cerveja (a qual não pude aceitar por não estar bebendo). A produção não estava para brincadeira e deu atenção em quase todos os aspectos (esse ‘quase todo’ será esclarecido mais adiante).
Tudo bem organizado, não só no que se diz respeito à parte de divulgação, já que a produção, que contou com vários integrantes no ‘cast’, se mostrou bastante preocupada em deixar tudo bem organizado e confortável para todos, incluindo, aí, o público.
A produção também disponibilizou um espaço, no camarim, para que a imprensa pudesse fazer entrevistas com as bandas integrantes do ‘cast’ do “Samonios Fest”. O Recife Metal Law, em minha pessoa, se fez presente apenas para fazer a cobertura do ‘fest’. As entrevistas foram conduzidas por Wilfred Gadêlha e sua equipe do Programa PEsado.
Sobre o ‘cast’, o achei bem interessante, já que o evento deu espaço para bandas que transitavam entre o Stoner, Doom e Psicodélico, estilos que, mesmo atualmente contando com grande espaço na mídia especializada e vários adeptos, não tem muitos eventos dedicados aos mesmos. Das bandas participantes, a que eu tinha total proximidade, por ter visto diversos shows desde a sua formação, era o Soturnus. Ótima oportunidade para conhecer ‘novas’ bandas.
Fiquei prestando atenção nos horários. Até subi antes do horário previsto para ter início dos shows – já que eu estava relaxando em um sofá que tinha no camarim. O público ainda era tímido, em se falando de número. A primeira banda fazia os últimos ajustes no palco, e isso já era perto das 22h00, horário designado para ter início os shows. Mas houve certo atraso e o primeiro show não começou no horário previsto.
Já era 22h40 quando o primeiro show teve início. O Demoniah começou sua apresentação com o público ainda em pequeno número – e pela movimentação, não parecia que o público ia aumentar estrondosamente durante o decorrer do evento. De cara vi que a parte sonora estava ótima, tudo bem equalizado e com todo o instrumental bem definido. A banda é adepta de um Death N’Roll realmente contundente, pesado e, por vezes, veloz. O início com a música “A Wolf Wanting Fresh Meat” já mostrou uma banda bem coesa, muito bem ensaiada e fazendo um som que realmente empolga. É possível ver doses de Death Metal, mescladas de forma bem inteligente ao velho Rock N’Roll (esse estilo ficava ainda mais evidente nas levadas mais rápidas) e até mesmo ao Stoner Rock/Metal, com alguns riffs na linha do velho Black Sabbath. Mas a maior influência, mesmo, é o Entombed. Não que a banda não tenha personalidade, longe disso, mas sons como “Sweet Little Hell”, “His Bloody Eyes” e “The Time Can Be Sold”, deixam nítida a influência, mesmo que o Demoniah procure trilhar um caminho de características próprias. O vocalista/guitarrista Jeovani Morais mostrou forte presença de palco e bastante segurança, por vezes conversando com o público e soltando uns ‘motherfuckers’. O quarteto se mostrou bem afiado, com destaque para a dupla de guitarristas (além de Jeovani, a banda ainda conta com Igor Capozzoli nas outras seis cordas). Mas não posso deixar de mencionar a qualidade de Francisco Olay, com seu baixo numa distorção impressionante e o exímio baterista Ricardo Lopes, e suas ótimas viradas e ‘quebradas’ de andamentos. Apesar de ser uma banda jovem, formada em 2015 (mesmo ano que lançou o EP “Uncontrolled”), a Demoniah mostra uma qualidade imensa.
Fim do primeiro show, intervalo para pequenos ajustes no palco e tomar uma água, cerveja... Epa! Uma das pessoas do ‘crew’ foi ao palco informar sobre essa falha, pois não havia, no andar superior do Burburinho, onde estava ocorrendo o “Samonios Fest”, bebidas para venda. Vale salientar que isso foi um erro grave do dono do espaço, afinal a produção do evento não ficou responsável pelo bar, mas correu atrás para contornar a situação, o que não foi demorado, assim como não foram demorados os ajustes de palco para o próximo show.
O trio formado por Lillian Lessa (baixo/vocal), Pedro Ivo (guitarra/vocal) e Thiago Alef (bateria), e que recebe o nome de Necro, subiu ao palco as 00h00. Eu não conhecia a banda, que está na ativa desde 2009 e é oriunda de Alagoas, mas pelo visual dos seus integrantes, meio que Hippie, já dava para ter uma noção do que iria presenciar. A impressão foi embora logo, já que mesmo bebendo em fontes advindas dos anos 60/70, a banda não fica no lugar comum e faz um som realmente de empolgar, acrescentando características próprias, mesmo isso sendo algo bem difícil na musicalidade que a banda desenvolve. A banda começou seu show com “Orbes”, trazendo uma bem vinda mescla entre aquele velho Rock Psicodélico com riffs pesados, numa veia Tony Iommi (o mestre mostrou ser a maior influência de praticamente todas as bandas participantes do “Samonios Fest”). De cara a banda agradou em cheio os presentes. Os vocais eram divididos entre o guitarrista Pedro e a baixista Lillian, e as influências eram diversas. Pudemos constatar algo do Progressivo da década de 70, com inserção da música brasileira dos Mutantes e até mesmo os riffs pesados, numa linha Stoner Rock e até mesmo algo do Led Zeppelin, inclusive em algumas incursões vocais de Pedro. A sonorização continuava bem equalizada, porém achei os vocais de Lillian um pouco baixo, ficando encoberto, por vezes, pelos demais instrumentos. Mas nada que atrapalhasse o bom desempenho do Necro. Além do visual e som, até os instrumentos vinham numa veia ‘vintage’. Foi um ‘set’ curto (precisamente 40 minutos), mas certeiro, e músicas como “The Assassin’s Song”, “Azul Profundo” e “Deuses Suicidas” foram de total agrado do pequeno público presente. E mostrando que a sua música é uma volta ao passado, até um pequeno solo de bateria nos foi apresentado.
Os horários estavam sendo cumpridos, mesmo com o atraso inicial para começar o ‘fest’. Não havia grandes lapsos entre um show e outro, algo a se bater palmas, pois isso evita cansaço desnecessário.
A terceira atração da noite é uma de minhas preferidas no Underground, não só nordestino. Esse era o terceiro show da banda paraibana Soturnus que eu estava tendo o prazer de prestigiar só em 2016, e a cada apresentação do quinteto formado por Guilherme Augusto (baixo), Eduardo Vieira (bateria), Rodrigo Barbosa (vocal), Andrei Targino e Victor Hugo Targino (guitarras), me impressiono com a qualidade da banda. Não houve grandes mudanças para os shows anteriores que eu vi, apenas a troca do guitarrista Eduardo Borsero (em razão de viagem) por Victor Hugo Targino. No mais, uma banda coesa e que carrega mais de 15 anos de atividades, fazendo um som original, carregado de melancolia e peso. É isso que sempre pude ouvir no Doom/Death Metal do Soturnus; música carregada de muito ‘feeling’, e com algumas inserções góticas, principalmente nos vocais de Rodrigo, que sempre se alternam entre algo mais agressivo para algo mais cantado e limpo de forma totalmente natural. Sei que falei isso em resenhas anteriores, mas a qualidade vocal sempre impressiona. O ‘set’ trouxe músicas como “I Wish I Knew”, “Of Everything That Hurts”, a Heavy/Doom “Cry of Dawn” e “Pain and Pleasure”, essa anunciada como uma balada, mas que carrega momentos do Depressive Black Metal, até mesmo em razão dos vocais gritados, e, ainda, momentos tipicamente Heavy Metal, ao seu final. A grande surpresa da noite foi a presença de um dos membros fundadores do Soturnus, Rafael Basso, que fez participação vocal nas músicas “Ephemeral Lives” e “Cacophony of Wonderful Sounds”, mostrando que ainda se lembra perfeitamente de como cantar as músicas que ajudou a criar e gravar, antes de ter ido para a Suécia, onde formou o Unlit Face. Apesar de algumas pequenas falhas no bumbo da bateria, que oscilava por causa da sua microfonação, a qualidade da aparelhagem sonora se manteve. Isso ajuda a banda e agrada ao público.
Último intervalo da noite. A essa hora já tinha cerveja e água para quem quisesse. As bancas de merchadising, tanto das bandas do ‘fest’ como de outros ‘souvenirs’, se faziam presentes. Tempo para conversar, ver os materiais disponíveis, olhar o movimento na Rua Tomazina, onde havia muita gente, afinal tinha um show gratuito, segundo informações e alguns presentes, e até mesmo para uma rápida passagem de som da banda que fecharia a primeira edição do “Samonios Fest”.
O Son Of A Witch, apesar de estar na estrada desde 2008, e ter lançado alguns EP antes de seu álbum de estreia, ano passado, era uma banda que eu havia ouvido falar muito pouco, mesmo trazendo em sua formação dois integrantes bem conhecido no meio Underground potiguar. Era 01h05 e a banda dava início ao seu show, trazendo uma sonoridade arrastada, densa, e mesmo que os riffs de “Thrones in the Sky” (título do disco de estreia) carreguem na influência do Black Sabbath, a banda caminha para um lado mais lento, flertando além do Stoner, com o Doom e até o Funeral Doom Metal, em razão dos momentos extremamente cadenciados. Os vocais de “King Lizzard” são apresentados de forma ‘limpa’, numa veia Heavy Metal, com algumas inserções de algo mais ríspido em um ou outro andamento. O ‘set list’ do Son Of A Witch, que durou mais de uma hora, contou apenas com quatro músicas próprias e, por aí, o nobre leitor tem uma ideia de como são as músicas da banda: arrastadas e longas, e isso abre espaço para algo mais psicodélico, em pequenas nuances. Todas as músicas próprias vieram do disco de estreia e, além da faixa-título, executaram “Alpha Omega Astra”, “Far Away From Dreaming (Giant Spheres and Humanoids)” e “Jupiter Cosmonaut”. Talvez devido à distorção (que o diga as linhas de baixo de “Old Goat”) e as viagens alucinógenas das músicas, em dado momento apenas a guitarra de “Psychedelic Monk” teve que ficar no palco, já que “Gila Monster” teve que sair para trocar a corda quebrada de seu instrumento. O baterista “Asteroid Mammoth” conduz seu kit de forma contida, como as músicas pedem, mas nem por isso deixa de apresentar algumas viradas mais velozes, mas em doses homeopáticas. O show do Son Of A Witch deveria durar até as 03h00, o que de fato aconteceu, mas devido aos inúmeros pedidos, a banda executou mais uma música, dessa vez em forma de um medley do Black Sabbath, contendo as canções “Snowblind”, “Black Sabbath”, “Into the Void”, “A National Acrobat” e “Cornucopia”, com o vocalista, em algumas passagens, pedindo ‘ajuda’ a um papel para cantar as letras. Ao fim, a banda foi bastante aplaudida.
Sendo o primeiro evento produzido pela Paganus Prod., a sua equipe fez um ótimo trabalho, bem cuidado, zeloso em diversos aspectos. Claro, algumas coisas podem ser revistas, tais como iluminação de palco e até mesmo um backdrop para deixar o fundo do palco com um aspecto visual mais interessante. A parte das bebidas não é de total culpa da produção, mas essa mesma produção poderia ter visto isso com o dono do local, já que o público participante desse tipo de evento gosta de tomar umas cervejas, ainda mais com o calor que fazia no local. Com relação à sonorização, ela esteve ótima até o fim dos shows. As falhas, com relação a isso, foram mínimas. O ponto fraco mesmo foi o pequeno público. Eu, sinceramente, esperava um número maior de pessoas. O “grito” de apoio não deve ser dado só atrás da tela do computador. De resto, um evento bem cuidado e que merece aplausos e o principal: apoio.