JUGGERNAUT
A banda de Thrash Metal Juggernaut surgiu na cidade catarinense de Blumenau, em 2005, e no mesmo ano lançou uma Demo homônima. Mostrando que não estava para brincadeira, no ano seguinte lançou o seu excelente ‘debut’ álbum, “Lines of the Edge”, de forma independente, o que não impediu que o nome da banda fosse bastante difundido, apesar e os shows se limitarem a sua região. Durante o período dos primeiros lançamentos algumas mudanças na formação ocorreram e apenas o guitarrista Célio Jr. permanece desde o início. O segundo álbum, “Ground Zero Conflict”, foi lançado em 2011, também de forma independente, e vem sendo divulgado até os dias atuais. Atualmente a banda conta com Valda (baixo), Cícero (vocal) e Alefer Reinert (bateria), além do já citado Célio. Essa formação já começou a trabalhar no novo álbum, e maiores novidades sobre a banda podem ser encontradas na entrevista a seguir.
Recife Metal Law – O primeiro álbum do Juggernaut, “Lines of the Edge”, foi lançado em 2006 e com ele vieram diversas mudanças na formação da banda. A que se deveu isso?
Célio Jr. – Hoje, se você analisar todas as bandas do cenário Underground do Brasil, eu diria que é difícil você encontrar alguma que tenha permanecido com a mesma formação por mais de cinco anos. De modo geral, o motivo principal se deve a dificuldade de conciliar a banda com a vida pessoal, conjugal e, principalmente, profissional. Querendo ou não, é necessária uma grande dedicação para compor, gravar, enviar discos pra imprensa, responder e-mails, entrevistas, procurar shows, viajar grandes distâncias para tocar (muitas vezes dormindo mal e, por que não dizer, se metendo em roubadas). Una isso ao tempo gasto com a convergência entre vários canais que não existiam no passado (facebook, myspace, twitter, blogs, enciclopédias de metal, etc.), mas que hoje são primordiais para a divulgação do nosso trabalho. Isso sem falar de todo o investimento financeiro em equipamentos e as horas de estudo com o instrumento. Todo mundo sabe que hoje ninguém vive só do Metal. Isso é utopia. Quando um festival acaba num domingo à tarde, você terá que desarmar a barraca, guardar os instrumentos e batalhar para ganhar a vida, pois na segunda-feira é dia de trampo e as contas não esperam. Além desse sacrifício todo, a arte “underground”, como um todo, passa por grandes dificuldades. Isso se deve tanto por parte do governo, com a lei do incentivo à cultura (que, pelo menos aqui em Santa Catarina, é balela), como o próprio povo, que na minha opinião regrediu muito no interesse cultural de alguns anos pra cá. E essa crise se reflete em toda uma cadeia: os músicos e artistas em geral, sejam eles artistas plásticos, de teatro, de rua, etc. Então você pode estar se perguntando: “Mas Célio, por que então vocês se dedicam tanto a algo que não traz retorno?”. Na realidade existe, sim, um retorno, mas ele não é, digamos, palpável. A vontade de fazer Metal, de subir num palco e destilar aquela energia toda é algo que está no sangue. E entre as dificuldades todas, tem também as coisas boas, que são de fazer amigos de verdade, trocar material com outras bandas, ter aquela camaradagem que vai além dos festivais e não é aquela falsidade do “tapinha nas costas” ou do discurso tosco de “união”. Algo puro e verdadeiro, que está longe do cenário mainstream, onde um puxa o tapete do outro. Então, para resumir tudo, tocar Metal e ter uma banda é algo que você tem que encarar como um hobbie. Logicamente é um hobbie que requer muita dedicação e é aí que a maioria desiste, pois é muito mais cômodo estar em casa com a família ou beber uma cervejinha com os amigos num sábado à tarde do que estar lá, batalhando horas de ensaio num estúdio, gastando dinheiro que você não sabe se terá retorno, ou viajando horas para fazer “apenas” um show.
Recife Metal Law – Célio, você falou sobre “roubadas”. Em quais tipos de “roubadas” vocês já se meteram?
Célio Jr. – Cara teve várias. De uns tempos pra cá até que melhorou bastante, mas teve época que foi foda. Não apenas com a Juggernaut, mas mesmo na época que toquei no Rhestus (de 2000 a 2004), foram situações desagradáveis que iam desde o produtor sumir do evento perto do final do show e colocar um bote expiatório pra explicar que o evento deu prejuízo e que seríamos ressarcidos depois, até casos do evento atrasar e você acabar tocando quatro, cinco da manhã para meia dúzia de bêbados. Teve também situação de fazer o show com equipamento totalmente desregulado e você ter que ser músico e mesário ao mesmo tempo, pois o segundo estava caindo de bêbado. Se eu fosse contar tudo, daria pra fazer uma entrevista só com essas histórias (risos).
Recife Metal Law – Voltando a falar sobre as mudanças, numa dessas, uma vocalista, Camila Silva, passou pela banda. A banda chegou a compor ou gravar algo com ela nos vocais?
Célio Jr. – Foi uma experiência que durou pouco tempo, foram apenas seis meses. Não chegamos a gravar nada com ela nos vocais, mas foi nesta época que compomos (Emerson Niederauer e eu) a maioria das músicas do álbum que posteriormente se tornaria o “Ground Zero Conflict”.
Recife Metal Law – O mais recente lançamento do Juggernaut é o álbum “Ground Zero Conflict”, lançado em 2011. Assim como o primeiro álbum, este foi lançado de forma independente. Tendo em vista que a banda é de uma qualidade inegável, o que falta para que um selo abrace a banda e faça os seus lançamentos?
Alefer Reinert – Boa pergunta. Talvez um dos motivos seja a visibilidade da banda em outros Estados, já que faz tempo que estamos tocando somente em Santa Catarina. Mas estamos tentando negociar shows fora de Santa Catarina e preparando material novo. Quem sabe logo mude.
Célio Jr. – Na realidade chegamos a ter algumas propostas em 2008 e 2009 mas que acabaram não se concretizando. Eu penso que, pelo menos para o Juggernaut, ter um selo apenas para dizer que tem, não muda em nada. Até porque nós nunca ficamos esperando as coisas acontecerem sozinhas ou dependendo de terceiros e sempre corremos atrás com nossos próprios recursos. Então, não queremos alguém que custeie nossos discos (claro que isso seria maravilhoso), carimbe a capa do nosso álbum com o logotipo do seu selo e fique com 50% da prensagem sem ajudar a banda em absolutamente nada nas questões da divulgação. A distribuição forte em locais que não chegamos é a nossa maior prioridade.
Recife Metal Law – Apesar das mudanças na formação, a sonoridade da banda continua intacta, obviamente mais evoluída e, de certa forma, mais intricada, mas sem deixar de lado a agressividade habitual da banda. Como vocês comparariam “Ground Zero Conflict” a “Lines of the Edge”?
Alefer – Para mim são álbuns bem diferentes, um segue uma linha mais reta, mais ‘old school’, e o outro é bem mais trabalhado, mas ambos são rápidos e agressivos. Uns vão preferir o primeiro e outros vão preferir o segundo, poucos vão gostar de ambos da mesma forma, creio eu.
Célio Jr. – Como o Alefer mesmo respondeu, são abordagens diferentes e foram fases muito diferentes na minha vida quando eu gravei cada um desses álbuns. Eu diria que o “Lines of the Edge” foi mais raça, mais coração e vontade de fazer sem ter conhecimento técnico, de produção e de estúdio. Muitas das coisas que eu criei no “Ground Zero Conflict” já pensava em fazer na época do “Lines of the Edge”, mas a banda toda não tinha a experiência, técnica e entrosamento que tem hoje.
Recife Metal Law – Sem qualquer demagogia, sempre gostei da sonoridade do Juggernaut, que mesmo sendo Thrash Metal, foge do lugar comum, mas, mesmo assim, se mantém Thrash Metal. Como foi criar as músicas para o novo álbum, continuar soando Thrash Metal, mas fugir do lugar comum?
Célio Jr. – Cara, na verdade é tudo questão de você ser eclético. Eu já fui um cara muito radical no início. Diria que o passar dos anos, a maturidade e a experiência de vida fazem você mudar. Hoje eu sou apaixonado pelo Rock e Metal Progressivo e nas bandas que são consideras escola, como o Marillion, Yes, Rush e o próprio Dream Theater (que é a banda do coração). Alguns projetos que acho bem interessantes, como o Liquid Tension, o Transatlantic entre outros. E ouço outras coisas fora do Rock/Metal, como Zé Ramalho por exemplo, que sou fã. Mas me criei na adolescência ouvindo Kreator, Sadus, Sepultura, Destruction, Death, Nuclear Assault além das bandas de NWOBHM. E eu sempre tenho meus discos violentos no carro (até mesmo pra ‘relaxar’ quando o trânsito me tira do sério! (risos). Eu acredito que tudo que você ouve lhe traz ideias, pois para mim só existe dois tipos de música, a boa e a ruim, e fico feliz em saber que os outros membros da Juggernaut também compartilham deste mesmo pensamento.
Recife Metal Law – Músicas como “Taking Life to Save Life”, “Shadows of Reality” e “Lost in Collapse” chamam bastante à atenção, pela forma como são executadas. Quais músicas desse álbum são as preferidas da banda, mídia especializada e Headbangers?
Alefer – “Lost in Collapse” e “Taking Life to Save Life” são minhas preferidas para tocar. Nos shows vejo o pessoal curtir bastante a “Shadows of Reality” e “Taking Life to Save Life”.
Célio Jr. – Essas duas que o Alefer comentou sempre temos que tocar ao vivo, pois a galera pede mesmo. Eu particularmente gosto de executar a “Free Words to Fight”, que é uma música que, pelo menos para mim, transmite muita energia.
Recife Metal Law – Outra música que me fez ficar espantado foi “The Last Awakening”, que traz a inserção de música árabe em seu final. O que espanta é que a banda fez isso com uma naturalidade incrível!
Célio Jr. – A gente fez algo parecido no primeiro álbum, naquela levada clássica da Xenophobia que todo mundo lembra quando ouve. Na realidade essas ideias diferentes saem em estúdio na hora da gravação, naquela hora que você pensa: “O que falta pra essa música ficar diferente e ao mesmo tempo impactante?”. Por isso que um álbum demora tanto para ser concebido. Agora imagine se tivéssemos que fazer tudo isso com a pressão de horário no estúdio? Seria impossível.
Recife Metal Law – Além da ótima musicalidade da banda, a parte lírica é bem cuidada, com letras bem escritas e que também fogem do lugar comum. Essa parte foi toda criada por você, Célio. Por que deixar essa parte apenas a cargo de um dos músicos?
Célio Jr. – Na realidade, antigamente essa função era dividida entre eu e o Daniel, que foi o vocalista que gravou o “Lines of the Edge”. “No Ground Zero Conflict”, quando o Cícero entrou na banda, eu já estava com a parte lírica praticamente concluída e foi por isso que ele não pôde contribuir. Mas pretendo mudar isso no próximo disco e escrever algumas letras ‘a quatro mãos’, como foi no “Lines of the Edge”. Eu não abro mão de revisar todas elas, complementar ou corrigir alguma coisa, pois, como você mesmo disse, as músicas tentam explorar coisas novas com influências de outros estilos e as letras têm que seguir esse mesmo conceito. Outra coisa que eu sempre procuro fazer é escrever com muita metáfora, passível de várias interpretações, pois isso aguça a vontade das pessoas de tentar criar uma história aonde a sua interpretação tenha coerência. Não adianta, por exemplo, a gente criar uma música de atmosfera mais tensa e intrigante e a letra falar de beber cerveja e zoar no ‘mosh pit’. Nada contra, muito pelo contrário, pois curto muito essas letras divertidas ao estilo D.R.I, mas é que cada tema tem que ter o seu lugar. E nada impede que, no futuro, a gente escreva sobre zoar e se divertir como um bom Headbanger. O mesmo ocorre quando eu penso no conceito do álbum, onde todas as letras devem estar ‘conversando’ entre si, não pode ser algo totalmente desconexo entre um tema e outro.
Recife Metal Law – Você também foi o responsável pela concepção da capa, que foi feita pelo artista gráfico pernambucano Alcides Burn. A capa de “Ground Zero Conflict” tem por intuito apenas ilustrar o título do álbum?
Célio Jr. – A capa foi baseada em todo um conceito que inspirou o álbum. O “marco zero do conflito” é tanto na questão militar, quanto o conflito da ética contra a religião (na pesquisa embrionária, por exemplo), o conflito dos laboratórios que mantém em segredo a cura de doenças para lucrar em cima dos enfermos. Temos também o conflito das pessoas que fariam qualquer coisa (inclusive passar por cima dos próprios familiares) para se tornar rico (por isso temos as pirâmides financeiras, um golpe antigo e clichê que faz tantas vítimas ainda hoje em dia). Especificamente o desenho da frente da capa representa o total desinteresse das pessoas em assuntos que podem impactar diretamente em suas vidas. Essas pessoas vivem à sombra da realidade, sem saber que, enquanto estão fazendo um simples piquenique, algum grupo terrorista pode estar prestes a explodir uma arma nuclear, ou que a guerra fria (o conflito capitalismo X socialismo) sempre existirá, mesmo que os players principais sejam alterados (EUA X Rússia). Ou mesmo que extraterrestres mantém contato com os humanos desde 1946 e que Rosswell e a área 51 não são apenas mitos criados pela indústria do cinema. Todo esse caldeirão de informação foi passado pro Alcides, que captou bem a ideia e fez, aliás, um trabalho belíssimo.
Recife Metal Law – O Juggernaut faz diversos shows em sua região, mas o que seria preciso para que a banda abordasse outras regiões do seu país?
Alefer – Muitas pessoas de outras regiões entram em contato conosco, acho que público tem. A maior dificuldade é o custo de levar uma banda para outro Estado, mas se algum organizador estiver disposto a nos levar, com certeza iremos, é questão de negociar e fazer acontecer!
Célio Jr. – 2007 foi um ano que abordamos diversas regiões do Brasil e da América do Sul. Na realidade temos um grande desejo de tocar aí pelo Norte/Nordeste e o que precisaríamos seria alguém para nos ajudar na logística da coisa toda, pois nosso interesse é muito grande.
Recife Metal Law – Tendo em vista que o último álbum de estúdio foi lançado há quase três anos, certamente a banda já tem outras músicas compostas. O que podemos esperar do Juggernaut para breve?
Alefer – Iniciamos agora a composição de material novo, então logo estaremos com novas músicas, e estamos nos preparando para o primeiro videoclipe da banda também.
Célio Jr. – Esse ano de 2014 a banda estará focada nas composições do próximo álbum e estamos estudando também a produção de nosso primeiro videoclipe.
Recife Metal Law – Videoclipe? Qual música servirá de tema para esse clipe?
Célio Jr. – Provavelmente será a “Taking Life to Save Life” mas ainda não fechamos 100% a ideia. Logo traremos mais novidades, quem viver verá!
Contatos: Rua Rio de Janeiro, 806 – Bairro das Capitais. Timbó/SC. CEP: 89.120-000.
E-mail: [email protected]
Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação, Marcus Carvalheiro e Carla Pereira