METACROSE





Muitas bandas surgem, algumas param no meio do caminho, após alguns shows ou Demos lançadas. Algumas se decepcionam ou não aguentam a dureza que é enfrentar os obstáculos; as decepções e o trabalho árduo para se manter firme e forte. Já outras passam anos, conta com mudanças, muitas delas em sua formação, e até mesmo na sua sonoridade. A Metacrose passou por tudo isso; demorou a lançar um full lenght, mas quando o fez, fez com qualidade invejável, mesmo o lançando de forma totalmente independente. Tive o prazer de poder ver alguns shows da banda e toda a sua evolução durante os seus anos de atividade. Seu primeiro álbum, “Interrorgate”, veio para coroar toda a persistência da banda, porém, mais que isso, é um disco que pode ser considerado um presente para os amantes de boa música. É Death Metal, mas um Death Metal que não se prende aos clichês e, mesmo assim, continua soando pesado e brutal. O Metacrose hoje é formado por Demetrius Pedrosa (bateria), Israel Rêmora e Thiago Bandeira (guitarras), Paulo Roberto (baixo) e Vinicius Laurindo (vocal), este último responsável pelas respostas da entrevista a seguir.


Recife Metal Law – O Metacrose surgiu em 1998 e sua temática lírica (as letras eram feitas em português) tinha uma tendência antirreligiosa ou algo do tipo. Nessa época os integrantes eram bem jovens... O que vocês procuravam passar em suas letras?
Vinicius Laurindo –
Isso mesmo. No início nossas letras eram, em sua totalidade, uma crítica às religiões. Atualmente nossas letras continuam de natureza crítica, mas agora também reflexiva. O objetivo principal é fazer com que nosso público pense sobre problemas fundamentais do nosso tempo, questões políticas e filosóficas. Por exemplo, devemos nos contentar com nosso modelo político atual? Devemos agir moralmente? Como se pode justificar que é errado matar?

Recife Metal Law – Essa linha lírica durou até o lançamento da música “Dando Corda Para se Enforcar”, música que era tocada ao vivo, mas que nunca chegou a ser lançada oficialmente. Qual a razão para isso?
Vinicius –
Na verdade a música se encontra gravada no álbum “Interrorgate”, sendo que a letra foi passada para o inglês, ficando “Just Enough Rope”. Os arranjos foram reconstruídos, inclusive adicionamos uma introdução para ela, a faixa sete, “Interiorem”.

Recife Metal Law – Apesar dos seus mais de 15 anos de atividades, a banda lançou pouca coisa, sendo uma Demo, participação num Split (em vinil) e, recentemente, seu álbum de estreia. Esse espaçamento de tempo entre um lançamento e outro foi necessário para definir os rumos que a banda queria seguir e que culminou no álbum de estreia?
Vinicius –
Sim, sem dúvidas. O álbum “Interrorgate” é fruto de todas as nossas experiências durante todos esses anos. E o fato de ter lançado o EP “Trevas Abissais” em 2003, ter lançado um Split em vinil e ter participado de outras coletâneas em anos dispersos, foi sim uma grande conquista para nós. Muitas portas se abriram com estes materiais lançados. O espaçamento de tempo realmente foi importante para nós definirmos nossos objetivos e, sobretudo, para investirmos nas composições, arranjos e novas temáticas.

Recife Metal Law – Eu acompanho o Metacrose desde o seu início, inclusive vi alguns shows da banda, algumas mudanças em sua formação e o aprimoramento no seu Death Metal. Muitas bandas dizem que algumas mudanças vêm com o passar do tempo e que é algo natural. Mas, no Metacrose, essa evolução foi natural, era necessária ou foi algo realmente estudado?
Vinicius –
Sim, as mudanças foram acontecendo sem nenhuma exigência nossa. Eu não diria que era algo necessário, mas elas foram, sem dúvidas, muito bem vindas. Todos nós escutamos músicas de diversas origens e parece que isso contribuiu bastante durante o processo de composição.

Recife Metal Law – O primeiro álbum é simplesmente fantástico! Vou ser bem sincero: eu esperava por algo bom, nas não a esse nível. Em “Interrorgate” a banda superou todas (as minhas) expectativas. Eu fiquei imaginando o quão difícil foi chegar ao resultado final...
Vinicius –
Obrigado, Valterlir! Essa é nossa maior recompensa: saber que tocamos alguém de alguma forma. Chegamos a esse resultado com muito trabalho investido e muito apoio do público. Além disso, acredito que conseguimos lançar o CD “Interrorgate” simplesmente porque trabalhamos com aquilo que amamos: a música.

Recife Metal Law – O Metacrose é uma banda de Death Metal, as passagens brutais ainda se fazem presentes, mas o leque de influências, nesse álbum, é bem grande, seja de música acústica (ver “What’s Wrong With Killing?”), algo de música regional (ver “How Can I Know Who I Am?”) e até mesmo levadas mais sinistras e doentias, como ouvido em “Zé do Caixão”. Como foi poder juntar tudo isso e ainda se manter fiel ao que a banda sempre se propôs a fazer?
Vinicius –
Nossa composição foi espontânea e valorizando a influência de todos os integrantes da banda. Nossa fonte de inspiração não se baseia apenas no Metal. Escutamos diversos gêneros, desde o popular a música erudita. Unir todas essas influência e manter ainda uma linha “Death Metal” foi e continua sendo, para nós, algo prazeroso de escutar e, claro, de tocar.

Recife Metal Law – Os músicos Marcus Siepen, Nívea Maria Santos e Thomaz Rodrigues, engrandeceram, ainda mais, a musicalidade contida no álbum de estreia. Como surgiu a ideia de chamar esses músicos para participarem do álbum? As partes em que cada músico participa foram compostas especialmente para tais músicos?
Vinicius –
Não se esquece da participação do Zé do Caixão, rapaz! (risos) A contribuição do José Mojica em nosso CD é um orgulho grande! As participações foram importantíssimas para a atmosfera do CD e as ideias foram surgindo espontaneamente durante a produção. Mas o único participante que criou seu próprio trecho de execução foi o Marcus Siepen (Blind Guardian). Todos os arranjos foram criados por Thiago Bandeira, responsável pelos arranjos e influência da música erudita na Metacrose.
 
Recife Metal Law – Existem duas músicas instrumentais, “Interiorem” e “Exteriorem”. Elas foram colocadas em locais estratégicos no ‘track list’ do CD. O que realmente significam essas duas músicas?
Vinicius –
Digamos que elas sejam irmãs gêmeas. Mas uma é reflexiva, outra não. Enquanto a primeira dá continuidade à temática do CD, a segunda é o prelúdio do silêncio. Os momentos distintos em que elas estão inseridas no CD podem remeter ao abismo existente entre a fala e a práxis. Mas dentre diversas interpretações, o válido mesmo é escutar todo o CD e repensá-lo/interpretá-lo a partir de suas próprias realidades.

Recife Metal Law – Como já mencionado, vocês chegaram a tocar em alguns shows a música “Dando Corda Para se Enforcar”. Eu já havia percebido que essa música havia se transformodo em “Just Enough Rope”, como você mencionou no início e isso eu percebi porque a letra dela faz referência àquela música em português....
Vinicius –
Exatamente! É a mesma música, sendo que com novos arranjos, um novo refrão. E o atual título em inglês parece ser a tradução mais equivalente do antigo título em português.
 
Recife Metal Law – A temática lírica apresentada é realmente interessante. As letras farão com que o ouvinte questione várias coisas, como, por exemplo, o que é democracia. A letra de “Is This Democracy” não parece ter sido influenciada pelos protestos ocorridos no Brasil, mas casa perfeitamente com o que vem acontecendo em nosso país. Porém a letra não incentiva ao vandalismo, mas não deixa de ser, de certa forma, agressiva. Existe como mostrar inconformismo de forma pacífica?
Vinicius –
Sim, com certeza. A arte é uma ótima e eficiente oportunidade para se protestar de forma pacífica. Isso não significa, porém, que devemos criticar e cruzar nossos braços diante de tantos problemas políticos. Devemos demonstrar de alguma forma (pacífica) nosso inconformismo, mas também tentar estreitar ao máximo nosso pensamento de mudança com nossas ações diárias. Quanto aos protestos de junho de 2013, eles realmente não possuem nenhuma influência em nosso CD, mas eu diria que foram acontecimentos importantes para reflexão. Mesmo os milhões de manifestantes nas ruas não representam a totalidade do nosso país. Acho melhor parar por aqui e deixar essa discussão para os cientistas sociais (risos), mas foi curioso lançar um clipe na mesma época das manifestações e com a mesma temática.

Recife Metal Law – O álbum foi lançado de forma independente, mas isso não significa que foi algo lançado de forma simples. A gravação é extremamente bem cuidada e deixou a sonoridade da banda com uma qualidade incrível. Como foi o trabalho na parte de produção sonora?
Vinicius –
Tomamos o cuidado para que o CD saísse exatamente como nós gostaríamos. Investimos bastante em toda a produção. Mas a produção musical é toda obra do produtor Victor Hugo Targino. Ele produziu todo processo de captação sonora, além de mixar e masterizar o álbum.

Recife Metal Law – A parte gráfica também merece elogios, muito bem cuidada e com a parte interior trazendo os músicos em desenhos no formato quadrinhos. Os músicos foram apresentados de forma violenta, já que as imagens os mostram espancado, agredindo, tipos como políticos, militares e religiosos. Qual o real significado de tais imagens?
Vinicius –
De fato estamos contracenando com figuras que representam diferentes esferas de poder. Podemos refletir a arte de nosso encarte a partir de alguns pontos. Os desenhos de Edi Guedes ilustram conflitos que permeiam nossa realidade. E muitos deles são censurados ou simplesmente caem em esquecimento. Expor essa existência através de imagens claras pode reforçar “nossa” proposta ideológica. O encarte pode até ser apontado como uma violência desnecessária, mas através da arte acredito que essa “violência” seja até saudável.

Recife Metal Law – Sendo “Interrorgate” um álbum independente, de que forma vocês vêm trabalhando a parte de divulgação?
Vinicius –
Nossa maior divulgação tem sido o próprio público, o que é, para nós, ainda mais gratificante. Além deles, nós contamos, também, com uma assessoria de imprensa especializada e outras mídias. Tem funcionado muito bem!
 
Recife Metal Law – Com relação aos shows, existe a possibilidade de a banda sair em turnê para divulgar o álbum de estreia?
Vinicius –
Com certeza! No primeiro semestre de 2014 nós fizemos shows pelo nordeste e sudeste. Nosso plano é expandir e intensificar nosso ritmo de apresentações. E, inclusive, espero revê-lo em breve em algum desses shows!

Site: www.metacrose.com
E-mail: [email protected]

Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação, Thercles Silva