GREENSLEEVES





Apesar de duas décadas de sua formação, a banda de Prog Metal curitibana GreenSleeves não tem muitos lançamentos. Para ser exato, a banda lançou uma Demo e dois full lenghts, sendo o mais recente “Inertial Frames”, lançado de forma independente em 2014. A banda passou por algumas mudanças em sua formação, porém três dos músicos que deram início ao GreenSleeves ainda se encontram na banda: João Koerner (baixo), Cícero Baggio e Victor Schmidlin (guitarras), além de Luis Requião (bateria) e Gui Nogueira (vocal), que estão na banda desde 1997, apesar de algumas idas e vindas. A entrevista a seguir ficou bem elucidativa, com todos os integrantes tendo respondido às perguntas. Então, confiram!

Recife Metal Law – O Greensleeves surgiu em 1993, dois anos depois lançou uma Demo e em 1998 deu uma parada em suas atividades. Por que essa parada ocorreu?
Victor Schmidlin –
O embrião da banda começou em 1993. Éramos adolescentes, amigos de infância ou de colégio. Já tocávamos alguns covers e ensaiávamos. Mas consideramos como início da Greensleeves o ano de 1995, que foi quando a banda passou a ter a formação com cinco integrantes (vocal, duas guitarras, baixo e bateria) e passamos a compor material próprio e fazer shows. Mesmo com as diversas pausas, estamos completando 20 anos com este nome!
Cícero Baggio – A banda acabou em 1998 porque estavam acontecendo muitas mudanças na formação, não conseguíamos manter o grupo completo por muito tempo. Por exemplo: foram quatro bateristas em um ano! Além disso, vieram faculdade, estágios, empregos e a falta de perspectiva do Metal no cenário nacional acabou deixando a música em segundo plano. Para completar, em 2001 o Victor se mudou para Brasília, o que tornou as coisas ainda mais difíceis. Mas nos mantivemos sempre em contato, e todos continuaram na música, em projetos variados.

Recife Metal Law – O nome da banda, em bom português, significa “mangas verdes”. Uma banda surgida na Argentina em 1989, e que chegou a lançar um full lenght, tinha esse nome. Por qual razão vocês escolheram esse nome para a banda?
Victor –
No final de 1994 gravamos uma Demo comigo cantando, e o resultado não agradou a ninguém. Éramos então a banda ‘Wolverines’, mas sabíamos que não era nada definitivo. Colocamos então um anúncio em busca de um vocalista, que logo foi respondido. Foi esse nosso primeiro vocalista quem sugeriu o nome Greensleeves, inspirado na música folclórica britânica.
João Koerner – Na verdade, até hoje eu nunca tinha ouvido falar dessa ‘xará’ argentina. Na época não tínhamos acesso à internet e consultar esse tipo de informação era bem mais complicado. Quando decidimos retomar a banda, em 2007, chegamos a pesquisar se deveríamos voltar a utilizar esse nome e, inclusive, comunicamos algumas bandas homônimas sobre a nossa existência.

Recife Metal Law – Após quase dez anos de inatividade, em 2007 a banda voltou as suas atividades e em 2009 lançou seu primeiro álbum. Entre o início da banda, o lançamento da Demo, a parada, o que mudou no Greensleeves para o primeiro álbum?
Victor –
De 2004 a 2006 eu toquei na Dynahead, que hoje é um dos expoentes do Prog nacional. Isso me trouxe uma influência bem mais pesada. Quando saí da banda decidi fazer um disco solo e queria aproveitar materiais antigos da Greensleeves. O João então propôs de fazermos isso juntos, reunindo a Greensleeves. Em 2007 cada membro morava em um canto do Brasil. E, ainda assim, conseguimos retomar o projeto.

Recife Metal Law – Como foi à receptividade de “The Elephant Truth” e a sua distribuição, tendo em vista que o mesmo foi lançado de forma independente?
Cícero –
Posso dizer que foi inesperada, muito acima das nossas expectativas. Foi uma experiência muito gratificante. Recebemos excelentes críticas nacionais e internacionais, aparecemos na revista Guitar Player, via de entrevista. Esgotaram-se todas as cópias do álbum. Hoje, o “The Elephant Truth” só pode ser adquirido digitalmente.

Recife Metal Law – O novo álbum recebe o título de “Inertial Frames” e novamente foi lançado de forma independente. Atualmente muitos selos diminuíram os seus lançamentos, mas trabalhar dessa forma não restringe à banda na hora de divulgar sua música?
Gui Nogueira –
Depois de todos esses anos juntos, restou claro para nós que não conseguiríamos nos sustentar apenas com a música. Cada um foi buscar uma alternativa. Felizmente, hoje estamos todos colocados no mercado de trabalho em áreas diversas, e não dependemos da nossa música para sobreviver. Ao mesmo tempo em que essa diversidade pode dar a impressão de um pouco de indiferença, foi justamente essa reação que tornou o nosso trabalho artístico muito mais leve e livre. Adoramos esta independência que nos permite fazer as coisas no nosso ritmo e do nosso jeito.
João – Aliás, com a internet uma banda independente consegue fazer a promoção do seu material mesmo sem estar vinculada a uma gravadora ou selo. Você tem uma rede de blogs, sites especializados, streaming de vídeos e música, lojas virtuais… De certa maneira, nosso alcance tem chegado aonde queremos, em prol do lado mais artístico e menos comercial da música. Tanto é que hoje os nossos discos estão disponíveis em diversos sites de download ilegal, e apesar de não ganharmos nada com isso, ficamos felizes por saber que existem fãs da nossa música em vários países.

Recife Metal Law – Percebi que as letras contidas nesse novo álbum são bem introspectivas. Mas qual foi o tema abordado nas letras de “Inertial Frames”? Vocês quiseram passar algum tipo de mensagem com os temas abordados?
Luís Requião –
Acho que isso é uma marca registrada nossa. Somos todos uns curitibanos meio fechados. (risos)
Victor – “Fireflies”, que abre o disco, é uma homenagem ao filme “Grave of the Fireflies”. “Unsolved”, uma reflexão sobre a busca pela verdade. Ela fazia parte do “The Elephant Truth” e acabamos deixando-a para o futuro, mas ela casa com a abordagem do disco anterior. “Construct” é inspirada na trilogia “Matrix”. “Dyschromatopsia” é uma crítica às vaidades humanas, às prioridades obtusas da sociedade, à falsidade e ao maniqueísmo. “Decoding Love” conta a história de um robô que se apaixona por sua dona, e esta decide formatá-lo. Em “Broken”, temos um coração partido, e em “Fixed” este coração se recupera pela autoestima e porque a vida nos reserva sempre coisas especiais. “Fading Heroes” trata dos sonhos de criança que abandonamos ao crescer – ser astronauta ou jogador de futebol – e acabamos nos tornando uns burocratas. “Seed of Ego” é uma crítica às pessoas que traem a sua confiança. “Lich Bride” é um conto de horror. “The Little Things” é uma apologia a curtir as pequenas coisas, aqueles detalhes que fazem toda a diferença. E “Inertial Frames of Reference” trata da inércia aplicada à vida das pessoas.

Recife Metal Law – A parte instrumental, algo comum no Prog Metal, é bem intricada e as músicas bem arranjadas, tendo grande alternância dentro do álbum, indo de momentos acústicos a levadas mais agressivas e densas, como ouvido em “Construct” e em “Fading Heroes”, essa com passagens beirando o Thrash Metal, isso para citar duas músicas. Como foi criar as músicas desse novo álbum e qual o caminho que a banda queria seguir?
Gui –
O nosso Prog tem influências ‘old school’, do Yes, Rush, Queensrÿche, Fates Warning e dos primórdios do Dream Theater. O Thrash acho que vem do Sepultura, que ouvíamos muito quando adolescentes, e depois o Nevermore, que une Thrash e Prog como nenhuma outra banda. E, claro, grandes pitadas de Iron Maiden, Helloween, Angra, Dr. Sin, Black Sabbath, Judas Priest. Tentamos juntar todas essas nossas paixões em uma musicalidade que soe coerente, ousada, pouco previsível e agradável.
Cícero – E o processo de composição desse disco foi diferente. Ao contrário do que aconteceu no álbum anterior, dessa vez eu era o único que não estava morando em Curitiba. A banda se reuniu com muito mais frequência para compor e arranjar as músicas. O trabalho coletivo mais constante fez muita diferença.

Recife Metal Law – O vocalista Gui Nogueira mostrou grande desenvoltura, pois interpreta de forma ímpar todas as músicas, e dá para sentir que ele põe um forte sentimento em cada letra que canta. Gui ficou livre para criar todas as suas linhas vocais ou isso foi um trabalho conjunto da banda?
Victor –
No “The Elephant Truth” eu tinha a maioria das músicas e das linhas de vocal desenvolvidas, então o Gui colocou sua interpretação em cima de algo já criado. Nesse novo disco ele criou tudo junto conosco, do zero. Tivemos tempo para deixá-lo amadurecer as ideias, e isso fez com que ele soasse mais solto, mais livre. Eu sou suspeito para falar, mas para mim o Gui é um monstro e fez um trabalho excepcional, que me emociona.

Recife Metal Law – Cada músico merece destaque, afinal de contas dá para ouvir a técnica de cada um em cada música apresentada, seja nos riffs de guitarras, solos, bases de baixo, levadas de bateria. Mas nem só de técnica é feito um álbum, uma vez que a música tem que carregar consigo ‘feeling’, e isso vocês conseguiram nesse álbum. Como foi juntar técnica e ‘feeling’ para construir “Inertial Frames”?
Victor –
Quando eu era adolescente queria um dia tocar que nem o Yngwie Malmsteen e o Tony Macalpine. Mas, com a maturidade, você conhece as suas limitações e quer fazer o que sabe bem feito. Isso faz com que tenhamos trechos complexos, tempos intrincados, mas sem focar demais no virtuosismo, que faz a música muitas vezes perder o sentido e a delicadeza. Eu sempre gosto de pensar em tirar e dar segurança ao ouvinte na mesma medida.
Cícero – Tem a ver também com a diversidade de estilos e influências de cada um de nós. O João, por exemplo, é da escola do Rock clássico e do Rock Progressivo. O Luís traz uma mistura de jazz e Thrash. Victor, Guilherme e eu temos mais contato com Prog Metal, mas também com abordagens e gostos diferentes. E ainda tenho a influência da música erudita.

Recife Metal Law – Algumas músicas são bem longas, inclusive com “Construct” tendo três partes e “Inertial Frames of Reference” sendo dividida em quatro movimentos, cada um com um título. Por que essas músicas ganharam essas divisões?
Gui –
Bom, o “The Elephant Truth” era um único tema dividido em 23 trilhas. Várias músicas daquele disco são quebradas em mais de uma trilha, e isso não foi tão bem assimilado pelas pessoas. Mas era a nossa proposta criativa. Dessa vez, optamos por deixar as composições mais longas na mesma trilha e somente indicar as divisões. Essas partes indicam que mudamos um pouco o assunto na letra ou de intenção musical, como a passagem de um capítulo em um livro. Acho que é uma característica bem comum ao estilo, que se apropriou dos diferentes atos de uma peça de teatro ou ópera.
João –
Sobre essa opção de divisão das músicas no “The Elephant Truth”, lembro que em um workshop em Curitiba, entreguei uma cópia do CD para o Felipe Andreoli, o baixista do Angra. Ele olhou e perguntou: - “Pô, 23 músicas? Vocês são uma banda de Grind?”. (risos)

Recife Metal Law – Ainda sobre “Inertial Frames of Reference”, o título ficou bem redundante, não?
Victor –
O título se refere às leis de movimento e inércia de Newton. Em português, chama-se Referencial Inercial Newtoniano. A música faz uma analogia a essas máximas da física, fazendo um paralelo com a vida das pessoas. As forças externas exercendo pressão – a família, o trabalho, a mídia, e a inércia que faz todos seguirem um roteiro de nascer, crescer, se formar, casar, ter filhos, se aposentar e morrer, que mais parece um movimento retilíneo uniforme. Há, nessas leis, o comparativo entre o que um suposto observador percebe e o que o objeto da ação vivencia, e isso tem tudo a ver com a nossa sociedade atual, ávida por demonstrar momentos de alegria aos outros em vez de vivenciá-los.

Recife Metal Law – Antes mesmo do lançamento do álbum, a banda, em agosto do ano passado, lançou um clipe para “Fireflies”, música de abertura de “Inertial Frames”. Vocês pensam em fazer mais algum clipe para alguma música desse álbum?
Luís –
Pensamos sim, claro. Já temos uma ou duas músicas candidatas. Mas, por enquanto, estamos divulgando o clipe de “Fireflies” e o próprio disco, para depois focarmos em uma nova produção.

Recife Metal Law – Esse segundo álbum chegou a ser lançado de forma digital ou apenas no formato físico, em CD?
João –
Ele está disponível no CDBaby, iTunes, Spotify, Deezer, Amazon e em todas as principais lojas digitais. O CD físico, hoje em dia, acaba tendo mais a finalidade de ser o nosso cartão de visitas para divulgação, mas também está disponível para quem quiser adquiri-lo. É só nos contatar no
[email protected].

Recife Metal Law – E como vem sendo a distribuição dentro e fora do Brasil desse novo álbum?
João –
Surpreendente. Temos enviado CDs para vários estados brasileiros, assim como para diversos países do exterior. Para nós, é sempre tocante quando vendemos um CD para Pernambuco ou para Goiás, por exemplo, ou para países como Bélgica ou Austrália, como fizemos recentemente. Lembramos muito da nossa adolescência, quando adquiríamos CDs e fitas-Demo de bandas obscuras. 

Recife Metal Law – Quais são os principais objetivos do Greensleeves para 2015?
Victor –
Em primeiro lugar, curtir o que está acontecendo. Estamos recebendo resenhas e opiniões super bacanas. E continuar divulgando nos nossos canais para ampliar a base de fãs. Como temos empregos que nos consomem bastante tempo, infelizmente não podemos nos comprometer com turnês mais longas ou agendas lotadas. Nosso foco é a arte e o respeito à nossa amizade, e esperamos que em 2015 consigamos fazer alguns shows para divulgação do “Inertial Frames”, assim como fizemos quando do lançamento do álbum anterior. E poder estar perto de gente que admira o nosso som.
Luís – Aproveitamos para agradecer a oportunidade de participar dessa entrevista. Valeu!

Site: www.facebook.com/greensleevesfb

Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação