LORD BLASPHEMATE
Para se fazer Black Metal não basta apenas tocar ou vociferar letras agressivas ou satânicas. Tem que ir além disso. Tem que se ter um estudo profundo para construir uma temática que realmente passe conhecimento verdadeiro. A banda potiguar Lord Blasphemate é uma das que seguem uma caminho de conhecimento e fala, em suas letras, com propriedade, de saber o que realmente fala. As letras da banda são de um conhecimento filosófico e mágico espantoso. Na verdade, como o próprio Hellhammer explanou nessa entrevista, não se tratam de meras letras ou músicas, são verdadeiros rituais. No Lord Blasphemate vem primeiro a parte literária, depois a música e isso eu percebi em todos os seus lançamentos, inclusive tendo um que destoa bastante dos demais – estou falando de “A Restless Shelter Under the Remote Stars", lançado em 2006. O mágico permeia todo o universo do Lord Blasphemate e talvez, por isso mesmo, a banda não é de divulgar muitas fotos, principalmente fotos promocionais. Na longa entrevista a seguir, tentem conhecer um pouco do Lord Blasphemate, entidade surgida materialmente em 1992.
Recife Metal Law – O Lord Blasphemate é, de certa forma, uma banda enigmática, não tão amplamente divulgada. A intenção sempre foi essa, de manter a banda como algo enigmático, sem divulgação em massa?
Hellhammer – Nós nunca nos preocupamos com a questão da divulgação. Acho que essa questão sempre foi secundária. Penso que isso é um pouco do reflexo de nossa personalidade, pois eu particularmente só aderi às redes sociais recentemente e, mesmo assim, quando comecei a me sentir alheio demais às outras pessoas, como se não coabitasse o mesmo mundo. Mesmo sem nenhuma forma de divulgação, me espanto com a quantidade de pessoas que conhecem o nosso trabalho. Em nosso Blog (que serve muito mais para divulgar nossa filosofia, do que a banda propriamente) temos acesso de pessoas dos mais diversos países, como Índia, China, Irã, além dos demais países europeus. Penso que em alguns casos a não divulgação funciona como uma característica que confere a banda certa mística e, na verdade, prefiro poucas pessoas que conheçam nosso trabalho, mas que o aprecie verdadeiramente, do que várias pessoas que o escute sem compartilhar a sua essência filosófica. Parafraseando Crowley no líber vel AL legis: “que meus seguidores sejam poucos e secretos, eles regerão os muitos e conhecidos”. Sem contar ainda que para mim sempre me pareceu uma contradição às bandas propagarem que pertencem ao Underground, mas buscam exposição midiática. De qualquer forma penso que essas considerações soam anacrônicas com o advento dessas interligações comunicativas.
Recife Metal Law – Eu conheci a banda a partir do seu primeiro full lenght, “The Sun That Never Dies...” (1997). Li a resenha na Roadie Crew e encontrei o CD numa loja em Recife. Lembro-me que o vendedor me perguntou se eu queria ouvir antes e eu disse que não. Quando cheguei em casa e coloquei o CD pra rolar, me espantei com o que me era apresentado. Mesmo praticante de um Black Metal, a banda fazia um som com características únicas. Como foi gravar o primeiro álbum após duas Demos lançadas?
Hellhammer – Fico agradecido quando você diz que esse trabalho tem “características únicas”, pois o anseio de muitos músicos é produzir uma música que tenha identidade própria. Mas não gosto de elucubrar e, a bem da verdade, às vezes acho aquele trabalho influenciado por muitas bandas, principalmente o Horrified, que eu escutava muito na época. Além de termos os pés plantados no Black Metal grego. Acho que o segundo full lenght, “A Restless Shelter Under the Remote Star”, mais próprio e característico da banda. De qualquer forma, muitos gostam mais desse trabalho mesmo. Nós gravamos em Recife, no estúdio de Hubert Resenbauer, onde muitas bandas pernambucanas gravaram, tais como Decomposed God, Mary Sinner Bell, Elizabethan Walpurga, entre outras. Era um estúdio pequeno, com uma mesa de oito canais e, somando ao fato de que tínhamos que nos deslocar desde a nossa cidade e arcar com todos os gastos, foi algo difícil. Mais difícil ainda era lançar um CD em 1997, onde as facilidades e gastos não eram os mesmos de hoje. Foi importante a parceria com nosso irmão Oscar da Blasphemy Production, que nos convidou e apostou no projeto, lançando esse material. Hoje nosso maior orgulho é saber que ele esgotou rápido e até hoje obtém uma boa lembrança na memória dos Metalheads. Recentemente a Blasphemy Production relançou o “The Sun That Never Dies...” em versão vinil.
Recife Metal Law – Dentro do Heavy Metal (falo, inclusive, dos seus subestilos) não é nada fácil criar algo com características próprias, mas o Lord Blasphemate fez isso logo no seu primeiro álbum. De onde veio à inspiração para criar uma sonoridade única dentro do Black Metal?
Hellhammer – Como disse acima, não sei se nosso som é tão original assim. Mas já escutei muitas pessoas falarem isso também. Penso que pertencemos à influência da escola do Black metal Grego dos anos 1990. Mas sei, também, que temos algumas características próprias e quando alguns amigos escutam alguma música nova que fiz me dizem: “Isto é tua cara!”. A busca por uma identidade própria deve ser o objetivo de toda banda e é um dos maiores desafios a ser conquistado. Como sempre digo: “copiar é fácil... difícil é criar”. No primeiro trabalho eu não tinha noção de que estava fazendo algo novo. Achava que era muito influenciado pelo que eu escutava na época. Quando gravamos o segundo senti que nos aproximávamos de algo mais original (embora fosse um trabalho diferente do anterior), e no terceiro e quarto trabalhos comecei a olhar a obra como um todo e, talvez, começar a perceber que você tem um pouco de razão, quando fala de “características próprias” no LB666. Isso para nós é muito gratificante, saber que nesses 22 anos de batalha pudemos deixar a nossa própria contribuição para o Metal nacional e não passarmos apenas como uma mera cópia de banda. Com relação as nossas influências, além da já citada escola do ‘old’ Black Metal Grego, gosto do velho Metal Tcheco e Polonês. Mas o mais importante é perceber a música como algo sistêmico e não compartimentado, vislumbrando-a em toda a sua totalidade.
Recife Metal Law – Em 2006 a banda lançou o seu segundo álbum, “A Restless Shelter Under the Remote Stars”. Com ele veio uma grande mudança, já que a sonoridade da banda deixou a rispidez/agressividade, mesmo que com melodias apuradas, do primeiro álbum, e fez um som calcado no Power Metal. O que proporcionou uma mudança tão brusca na sonoridade do Lord Blasphemate?
Hellhammer – Até hoje muitos não gostaram da sonoridade desse álbum e as comparações com o “The Sun That Never Dies...” foram inevitáveis. Aquele álbum foi composto e gravado levando conscientemente em conta quatro considerações importantes. A primeira, que ele é um álbum temático, todo baseado na cabala hebraica e suas correlações com a árvore da vida. Se a letras se interligavam, a melodia também buscou essa interligação. De modo que o disco todo é uma grande música dividida em partes, como capítulos ou estágios das sephirots. Segundo é que ele seria um disco atemporal. Ele não seria feito para aquela época, mas para tempos futuros. O que se confirmou no presente, quando várias pessoas novas, que não conheciam nosso trabalho e que escutaram esse disco, teceram bons comentários sobre o mesmo. Terceiro é que achamos abominável que uma banda passe o resto da sua vida lançando trabalhos iguais uns aos outros, como se fossem sempre o mesmo disco. Como disse Mille Petrozza: “As únicas bandas que podem gravar discos iguais são o Motörhead e o AC/DC”. É preciso sempre buscar melhorias, pois o homem é fruto de sua época, não podendo estar preso ao passado, pois “a água estagnada espera veneno”. Quarto, é que toda a banda tem o dever de criar um trabalho que seja inovador, que provoque polêmica e que quebre com os rótulos da mesmice, que muitos a obriga a permanecer, por achar que devem seguir “uma fórmula pré-estabelecida”. Não podíamos escrever uma obra que fosse uma continuação da anterior. O “A Restless Shelter Under the Remote Star” é este trabalho. Polêmico, desafiador, voltado para o futuro, onde houve a busca pela originalidade. E essas são as características que procuramos imprimir nos trabalhos seguintes e futuros.
Recife Metal Law – A temática lírica abordada sempre se manteve cheia de misticismo e obscuridade, tratando de temas relativos ao luciferianismo. A musicalidade da banda tem algo a ver com a sua temática lírica, digo, as letras são criadas antes mesmo da música?
Hellhammer – Correto. As letras e suas concepções são concebidas antes da parte musical. O LB666 sempre foi algo mais literário do que musical. Muito mais filosófico do que melódico. Sua criação se deu mais para expressar uma inquietude espiritual que aspirações musicais. Sempre estivemos mais focados na ideia do que na forma. A parte lírica sempre foi mais importante para nós; a música representa apenas o meio, o veículo para o transporte das ideias. Tanto que sempre fomos anversos a shows, nos concentrando mais na parte criativa. Nos anos de 1991 criamos o Movimento Ocultista Luciferiano, que é a base de nossa filosofia luciferiana (na época as pessoas só falavam de satanismo). Essa criação foi inspirada por sugestão de T.M.T. Magus VI. Após a criação dessa ‘corrente’ percebemos que as bases de nossa filosofia, precisavam de um canal, um veículo de comunicação com as pessoas. Daí nos foi sugerido, mais uma vez, que buscássemos a música como forma de divulgação e, dessa forma, criamos o LB666. Tanto é que no encarte já da primeira Demo-Tape falamos que o LB666 era o único representante do M.O.L.. A partir daí fizemos a simbiose Música-Magia, que acompanha toda a nossa obra. Recentemente recebemos a indicação de que poderíamos aprofundar mais nessa simbiose e passamos a inserir em nossos trabalhos a magia de maneira mais explícita e palpável, sem a forma velada e hermética de antes. Foi assim (já respondendo a questão posterior) que inserimos um mantra telêmico, Hino a Pan de Aleister Crowley, na obra “Ophisophia”, que tem uma função transcendente e ritualística. E na obra “Opus Gnosticum Satannae” inserimos frequências altas e baixas, mantras e entoações mágicas, de maneira direta e consciente. Por isso colocamos um aviso no disco, advertindo as pessoas para que as mesmas não o escute, desavisadas, e se os fizer, o faça com liberdade de conhecimento. Além de transcrevermos um trecho do Livro da Lei.
Recife Metal Law – Toda a parte lírica é criada por você, Hellhammer. Qual a influência do luciferianismo no cotidiano de Hellhammer?
Hellhammer – O luciferianismo é o caleidoscópio no qual eu filtro minhas relações sociais. Ele está presente em todos os aspectos de nossa vida e é o elemento norteador na condução de nossas vidas. Abrange os aspectos pedagógicos, filosóficos, históricos, políticos, econômicos e tudo o mais. Nós falamos de luciferianismo, porque ele faz parte de nossa vida e é um componente de nossa essência. Vejo muitas bandas que abordam temáticas obscuras, ou seja lá o que for, e, de repente, misturam ateísmo com paganismo, com satanismo, luciferianismo, cientificismo, anticristianismo e o que mais que for... Então eu me pergunto qual é sua ideologia, o que na verdade ele defende? Acaba ficando algo vazio e sem consistência. Essas pessoas no palco falam de coisas que quando estão em suas vidas cotidianas praticam coisas completamente diferentes. Eu defendo que uma banda deve se basear em três princípios: honestidade, sentimento e conteúdo e, infelizmente, muitas bandas pecam nesses quesitos e, por isso, suas músicas não empolgam, porque não são feitas com o coração.
Recife Metal Law – Nitidamente tu és a mente criativa por trás do Lord Blasphemate, mas Tormentor sempre está presente nas criações da banda. Qual é a real função de outros músicos na música do Lord Blasphemate?
Hellhammer – Apesar de minha pessoa ser o criador das músicas e das letras, o LB666 não é uma ‘one man band’. Ela funciona como um organismo social, onde os outros membros interagem contribuindo de acordo com suas idiossincrasias. E, assim, da dialética de diferentes visões e concepções vamos formando o arcabouço das composições. As músicas vão sendo compostas da contribuição dos membros da banda. Então, se eu escrevo as linhas de corda e teclados, a superposição da percussão dá outro rumo à música. A colocação dos vocais dá outro sentido e rumo as composições. Destarte, aquela ideia inicial que foi preconizada por mim ganhou uma nova forma e dimensão na medida em que os outros componentes foram acrescentando suas participações. O Tormentor era muito importante nesse trabalho. Ele funcionava como um ‘aparador de arestas’, me dando ideias e me conduzindo por determinados caminhos que eu não havia imaginado. Infelizmente Tormentor não pode participar desses dois últimos trabalhos. Mas mantemos contatos e espero ainda me reunir com ele para um novo trabalho.
Recife Metal Law – Mal’lak foi o vocalista nos dois primeiros álbuns da banda, porém no mais recente os vocais ficaram a cargo de Néliton Araújo. O que ocasionou essa mudança?
Hellhammer – O LB666 era uma banda sediada em Natal/RN, com a saída do primeiro vocalista, Black Vociferator, chamamos o Mal’lak, que é de Pernambuco. Já éramos amigos e acompanhávamos seu trabalho no Darkness Emperor e Elizabethan Walpurga (duas das melhores bandas de Pernambuco). Fizemos o convite e ele aceitou, nos surpreendendo com sua dedicação e profissionalismo. No entanto, o Tormentor teve que mudar de cidade e eu também. Ficamos cada um morando em cidades diferentes e isso fez com que passássemos muito tempo sem lançar material novo. Até que decidi chamar novos membros para consubstanciar algumas ideias musicais que eu tinha desenvolvido. Daí a participação de Néliton Araújo, que trouxe uma nova roupagem para as músicas do LB666 com a mistura dos vocais rasgados e guturais (coisa que não existia antes). É aquilo que falávamos na questão anterior, sua participação contribuiu para dar as novas músicas uma nova percepção e novo direcionamento e o resultado é aquele que está lá. Contudo, no LB666, não existem ex-membros, todos são sempre membros que estão afastados por alguma vicissitude, mas que a qualquer momento podem se reunir para algum cataclismo apocalíptico.
Recife Metal Law – O novo álbum, “Ophisophia”, retornou com a musicalidade característica do Lord Blasphemate, calcada no Black Metal, porém com boas doses de melodias e certa influência do velho Heavy Metal. Mas soa bem diferente do disco anterior, “A Restless Shelter Under the Remote Stars”. O resultado obtido com o disco anterior foi à razão para a volta ao estilo típico do Lord Blasphemate?
Hellhammer – Interessante essa sua observação. Acho que, na verdade, foi isso mesmo que aconteceu. A gravação do “A Restless Shelter Under the Remote Star” deixou um hiato na banda. Como muitos não entenderam bem este trabalho, sempre escutamos as comparações com os discos anteriores e as críticas, e não queríamos que aquele fosse o último trabalho do qual as pessoas se lembrassem. Isso fez com que lentamente fossemos gestando um novo trabalho, que resgatasse o sentimento da Demo-Tape e do “The Sun That Never Dies...”, sem que, no entanto, fosse um continuísmo desses trabalhos. Desse pensamento surgiu o “Ophisophia”, que tentou ser um retorno à crueza dos primeiros trabalhos com uma marca do “A Restless Shelter Under the Remote Star”, caminhando para uma coisa mais original, uma espécie de Heavy/Black Metal. E aí é o que falávamos nas primeiras questões, acerca da busca pela originalidade. O resultado foi positivo, através de resenhas (inclusive uma muito boa aí de Pernambuco no site Arena Metal). Vimos que muitos realmente encararam esse trabalho como um retorno as nossas raízes mais “Black”. Em termos de letras, ele está mais denso, porém lírico. Mais intuitivo que racional. Esse caminho de busca das raízes se intensificou com o quarto trabalho “Opus Gnosticum Satannae”, onde recrudescemos mais ainda, sendo mais direto e a satisfação dos amigos foi maior ainda, a ponto de muitos se referirem a este Opus como um retorno a Demo-Tape. Infelizmente não sei que rumo será dado ao novo trabalho em fase de composição (“Lucifer-Prometheus”); que rumo ele irá tomar, se uma continuação de nossas raízes ou um novo passo musical ainda não abordado. De qualquer forma o LB666 é essa multiplicidade de sons e ideias, onde, apesar de aparentemente discrepantes, fazem, todos, parte de nosso universo onírico.
Recife Metal Law – “Ra Hoor Khuit”, música presente no atual álbum parece ser uma segunda parte de “The Egyptian Magick Ritual to Invocate Ra-Hoor-Khuit”. Os riffs e levadas são bem iguais. Seria uma nova parte ou apenas uma nova roupagem para uma música do primeiro álbum?
Hellhammer – Com certeza uma nova parte. Uma continuação das ideias desenvolvidas em nosso sistema musical e filosófico thelêmico. Precisávamos expandir a ideias de “Ra Hoor Khuit”, revelando uma nova faceta de sua multipersonalidade, e quando fizemos a base musical para a letra realmente percebemos que não só a letra havia tido essa continuidade, mas também a música. Coincidência? Acredito que não. Uma inspiração das mentes mais elevadas, que fez com que ambas as músicas tivessem essas pegada de ‘orientalidade’, como uma manifestação mística do Egito Ancestral.
Recife Metal Law – No fim da música “Lux Lugrubius Liturgy” foram acrescidos os vocais de Marcelo Ramos Motta, que recita o “Hymn to Pan”, de Aleister Crowley. Por que acrescentar “Hymn to Pan” a “Lux Lugrubius Liturgy”?
Hellhammer – Apesar de termos comentado o porquê numa das respostas, ressaltamos que a partir do “Ophisophia” e do “Opus Gnosticum Satannae”, radicalizamos no “mote-movimento-música-Metal-magia”, e em nossos novos trabalhos resolvemos abordar a magia de modo mais explícito e direto. Reforçando aquela concepção que o LB666 é mais uma missão exotérica, mística e mágica do que musical. Por isso a inserção de referências ocultas mais diretas. Aqueles que têm um mínimo de noção saberão o que eu estou dizendo, tanto nas músicas quanto nas fotos. Qualquer dúvida acesse o blog e assistam os rituais da O.T.O. e A.A.
Recife Metal Law – Eu já cheguei a conferir um show do Lord Blasphemate anos atrás, em Campina Grande/PB. Esperei bastante, já que a banda foi à última do ‘cast’, mas gostei bastante do que vi ao vivo. Por que os shows não ocorrem com tanta frequência para a banda?
Hellhammer – Primeiramente obrigado por ter ficado. Se for o show que eu estou pensando, você deveria ser o único assistindo. (risos) Nossa experiência em shows em Campina Grande nunca foi muito boa. Um show em 1993 foi o nosso primeiro show e acho que tocamos muito mal. Nesse último, tocamos por último e, salvo a sua exceção e a de João Paulo (“Baby”) de Recife, não lembro de ter visto mais ninguém. A verdade é que não gostamos de tocar ao vivo. Como eu te falei, o LB666 é mais filosófico do que musical e acho que não estamos mais na idade de enfrentar longas viagens em vans. Tem também as mudanças de formação que sempre atrapalham um pouco os planos, além das nossas ocupações mundanas. De qualquer forma, gosto mais do processo criativo que executório. Mas nada que esteja definitivamente pré- estabelecido, e quem sabe podemos voltar a fazer alguns shows.
Recife Metal Law – Sobre o EP “Opus Gnosticum Satannae”, dessa vez um novo material não demorou a ser lançado. Esse EP conta com alguma sobra de música de “Ophisophia”?
Hellhammer – Algumas pessoas realmente perguntam se o “Opus Gnosticum Satannae” é uma sobra do “Ophisophia”, pois a proximidade de lançamentos entre eles foi pequena (2013 e 2014). Mas, na verdade, são trabalhos independentes e que foram feitos de maneira separada. Explicá-lo é um pouco complicado. Mas pensamos em encerrar as nossas atividades com o nosso próximo trabalho, o “Lucifer-Prometheus”. Só que este trabalho seria o quinto lançamento, contando a partir da Demo-tape, que contamos como primeiro trabalho. Vimos, então, que não poderíamos terminar sobre esse signo algarítimo e que o 6 (seis) seria mais ideal para finalizarmos nossa atividade. Pelo menos foi essa a determinação que recebemos. Então resolvemos gravar o “Opus Gnosticum Satannae” para que ele fosse nosso quinto trabalho e, assim, quando saísse o nosso próximo disco, estaríamos com o círculo fechado no 06 (seis), mais propício para finalizarmos o conjunto de nossa obra. De qualquer forma, a ideia inicial é que ele saísse sob a forma de disco de vinil, com uma edição limitada a 333 cópias. Era um trabalho que gostaríamos de dar a ele essa áurea mais fechada. Tanto é que no final existe uma concessão de grau mágico, concedido por Marcelo Motta (líder da O.T.O. no Brasil) a Euclides Lacerda. Um documento raro e inédito que despertou controvérsias no mundo ocultista brasileiro por décadas. A ideia inicial é que ele só fosse escutado girando o disco de trás para frente, como a moda antiga. Infelizmente discos de vinil no Brasil são muito caros, o que inviabilizou este lançamento por parte da gravadora. Pensamos ainda e não lançá-lo, tornando-o uma obra oculta. Por fim, resolvemos lançá-lo. O que no final acabou sendo uma solução acertada, pois foi muito bem recebido pelo público.
Recife Metal Law – “Opus Gnosticum Satannae (Ecclesiae Gnosticae Luciferiani Canon Missae)” é uma música bem longa, passando dos dez minutos. Por que vocês decidiram colocar uma música tão longa nesse EP?
Hellhammer – O processo de composição é algo interessante para mim. Às vezes ouço as pessoas dizerem que escreveram músicas desta ou daquela maneira. Realmente ou gostaria de poder fazer isto e direcionar melhor o processo criativo. No entanto não é assim que as coisas se processam para nós. É difícil controlar uma música. Ás vezes ela sai muito rápido, como se já estivesse pronta dentro de nossas cabeças. Outras vezes ela demora anos para ser feita. Parra você ver, neste novo disco em que estamos trabalhando tem uma música que é de 2006 e só agora ela será gravada. Parece que elas adquirem vida própria e nos escapam o controle. O mesmo acontece na literatura. Ao escrevermos algo, partimos inicialmente com uma ideia pré-concebida, mas que no transcurso do tempo elas se transformam e tomam caminhos inesperados. Contradizendo até mesmo nossas convicções. Tudo isso, porque é preciso desligar o eu racional ou objetivo e abrir espaço para o intuitivo da mente subjetiva, onde reside o plano criacional. Como te disse antes, a ideia do “Opus Gnosticum Satannae” é que saísse em vinil. Para facilitar o lançamento e barateá-lo, teria que ser duas músicas de seis minutos. Uma ainda conseguimos colocar nessa faixa de tempo, que foi “Christosiris”, no entanto a outra, que dá nome ao trabalho, foi impossível. Como o tempo já havida extrapolado e não iria haver mais o vinil, decidimos acrescentar um instrumental e um cover do Rotting Christ, que havíamos gravado para o tributo do mesmo, de maneira a dar maior volume. Mas fiquei satisfeito com a música ter alcançado os 11 minutos, pois foi meio que um retorno ao tempo da Demo, onde fazíamos músicas de 12, até 15 minutos.
Recife Metal Law – Como já mencionado nesta entrevista, existem algumas pequenas mudanças nesse novo trabalho da banda, principalmente no que se diz a musicalidade, que agora está mais ritualística. Essa agora será a tônica para os próximos trabalhos do Lord Blasphemate?
Hellhammer – Eu defino o “Opus Gnosticcum Satannae” como a verdadeira missa gnóstica transformada em música. Ele é realmente um disco ritualístico; que contém diversos elementos ocultos em suas entrelinhas. Vejamos: a introdução dá-se com a voz de Aleister Crowley invocando as chaves enochianas, para abrir o primeiro de 49 portais, o que por si só é muito denso (mesmo porque ele usa a língua enochiana do Dr. John Dee). Nessa “Intro” como na música título, há frequências de alta e baixa vibração, inspiradas nos rituais dos monges tibetanos, que com suas tropas criavam uma frequência sonora capaz de alterar os estados de consciência. Por isso colocamos essa advertência no próprio CD, para que as pessoas, ao escutarem, estejam realmente conscientes do que estão fazendo. Na parte gráfica, colocamos o ‘comento’ do liber al vel legis, que abre a lei de Thelema. As letras são ambas sobre a missa gnóstica e seus mistérios, buscando resgatar seu significado. “Christosiris” é a comparação entre o rito secreto de Osiris e como a liturgia católica se apropriou de suas ideias, deformando-a e usurpando para seus interesses. É por isso que Eliphas Levi afirmava que o missal católico é um dos mais profundos rituais mágicos. Porém, erradamente canalizado para uma corrente sem vida, que evocada por milhões acarreta em enfermidade corporal, mental e espiritual. A música título foca no verdadeiro significado da eucaristia. O que é na verdade a hóstia, consagração e transubstanciação usadas em todos os ritos religiosos do mundo. Apenas um simbolismo da verdadeira comunhão eucarística que aparece sobre diversos nomes em diversas culturas e que nada mais é do que o arcannum arcanorum ou a magia sexual. Então o “Opus Gnosticum Satannae” foi criado para ser uma missa ritualística em forma de música. Por isso eu não recomendo a todos. É um disco que foi criado com um propósito e obedecendo certos princípios, até mesmo no estúdio quando fomos gravar.
Recife Metal Law – Outra diferença é que nesse EP vocês abriram mão dos teclados. Qual a razão para isso?
Hellhammer – Ouvindo muitos anos depois o “The Sun That Never Dies...” fiquei com a impressão de ter abusado de elementos acessórios, como flautas, violinos, rabecas, guitarras espanholas, piano, teclados, vocais líricos, etc. Fiquei com a impressão que o disco saiu muito rebuscado, e que eu poderia ter feito mais simples e direto. Depois dele veio o “A Restless Shelter Under the Remote Stars”, que não tem nada disso, nem teclado, mas que tem muito trabalho de guitarra. O fato de ter feito esses dois disco muito musicais (cada um em sua proposta), me fez ficar com vontade de experimentar algo mais cru e direto. Mais guitarra e bateria e que fosse mais agressivo, com blast beats e tal. Daí veio a ideia dos dois últimos trabalhos. Algo mais direto, sem outros instrumentos, músicas mais curtas, batidas rápidas e tudo mais. Com o novo trabalho pretendo resgatar todos os elementos anteriores, inclusive teclados, frases com flauta nepalesa e tambores tibetanos. O desafio será utilizar esses instrumentos sem abusar em demasia, buscando um equilíbrio. De qualquer maneira penso que será um retorno àquela musicalidade do primeiro CD. Muitas das composições, inclusive, estão sendo feitas primeiro no piano e depois transposta para guitarras e contrabaixo.
Recife Metal Law – A capa, como a musicalidade e parte lírica do EP pedem, é bem ritualística. Como surgiu a ideia da capa?
Hellhammer – Interessante, porque eu não participei da criação da capa nos CDs anteriores. Os mesmos sempre ficaram a cargo do baterista Tormentor e o “Ophisophia” a cargo do Israel Souza. Com o “Opus Gnosticum Satannae” nós começamos a trabalhar as músicas sem nos preocupar com a capa, até que, de repente, a ideia nos surgiu, sem que ficássemos pensando sobre ela. Mais ou menos aquilo que falamos na questão anterior sobre processo intuitivo. Ela tem essa temática ritualística, porque o disco é ritualístico. Ela tem essa forma ‘old’ porque as músicas são cruas. Então penso que foi uma capa que expressava o que estava lá dentro no contexto da estética musical. Algo simples, sem rebuscamento, que evocasse uma ideia e estado de espírito presentes na música. Ela tem o espírito do LB666, como algo simples que somos, preocupados mais com o nosso desenvolvimento intelectual e filosófico, sem buscarmos holofotes midiáticos. Apenas divulgar ideias e despertar sonâmbulos dormentes, que hipnotizados nos altares de ouro da opulência e em vestígios de decrepitude sacerdotal alheiam-se a verdadeira natureza das coisas e do mundo em sua volta. Tapando os olhos com os escapulários de sectarismos estéreis, como bovinos esperançosos no abatedouro, esperando a volta da escrófula nazarita. Para finalizar, algumas palavras...
Site: http://lordblasphemate.blogspot.com.br
Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação, Flávio “Hellstorm” Bacelar e Jobson Galdino
O EVANGELHO SEGUNDO O LORD BLASPHEMATE
Escutai oh homens. Estas são as palavras da libertação.
1. A religião são as muletas para os enfermos da mente.
2. Quem espera o messias é servo de sua fraqueza. Cabe aos homens dominá-los.
3. A negação da matéria é a negação da vida. Quem o faz, são cadáveres decrépitos, que pensam ainda viverem.
4. O sacerdote é o vampiro dos parasitas da fé.
5. Reverência pelo temor. Eis o princípio do cristianismo.
6. Maldito seja o fiel seguidor. Mas, mais maldito seja o cientista religioso.
7. Deus é a ausência de inteligência.
8. A ciência. Eis o grande inimigo de Deus.
9. O pecado é o novo nome da virtude.
10. A moral, o dogma, e a religião são o novo cárcere do homem livre.
11. Desejar e não querer é o sentimento dos benditos (malditos).
12. Esse é o novo tempo. Mudam-se as leis (não existem mais leis). A moral, instrumento da hipocrisia, morreu no fogo de seu próprio opróbrio.
13. A partir de agora, há a transvalorização das palavras. Que o bendito seja maldito, que o santo, o calhorda e que a palavra cristão, seja a mais injuriosa ofensa.
14. Os pecados são as qualidades que fortificam o ser e sua individualidade.
15. Esses são os princípios dos fortes. Aos fracos... a servidão.
16. A ignorância é o grilhão das bestas que dizem-se humanas.
17. O homem é instinto. Tudo que é contra a natureza, deve ser banido, pois, constitui crime contra a própria vida.
18. Só os idiotas oferecem a outra face. Os homens retribuem a agressão, na justa proporção de cem vezes mais.
19. O ódio é o único sentimento verdadeiro. O amor? Puro desejo da matéria! Enganação dos sentidos.
20. Somente vencidos criam uma religião de piedade.
21. Que tipo de gente pode ver infâmia na nudez e no amor? Apenas o pior tipo de pessoa: O sacerdote!
22. O ceticismo. Eis o Deus do homem livre.
23. Os tijolos do templo: a miséria humana.
Seus altares: a escravidão.
Seus dogmas: a demência.
E seus sacerdotes: a depravação.
24. A seleção natural é a lei do homem. O homem é mau. É a imagem e semelhança de Deus.
25. Crer na recompensa divina é atestar a incapacidade de realizar algo na vida.
26. A crença no paraíso: maior demonstração da egolatria humana.
27. A luz é o esclarecimento da ciência; seu portador, portanto, é o pensamento puro e livre.
28. Todas as religiões são condenáveis. Ou baseiam-se no medo, ou na falsa esperança, ou na negação da natureza humana. São todas excrescência da decrepitude sacerdotal.
29. Quem espera o messias, equipara-se a bovinos esperançosos no matadouro.
30. O ouro, a luxúria e a egolatria, são os alicerces do altar que os homens jamais abolirão.
31. Qualquer forma de controle é um atentado contra a verdadeira vida.
32. Que ser é o maior de todos os sádicos senão Deus, Que adora o martírio da matéria?
33. Maldita seja a choldra, que conhecendo a verdade, permanece na miséria existencial. Libertai homem. Esta é a era da razão.
Só os fortes sobreviverão.
2007 0u o 15º ano da libertação humana.
Movimento Ocultista Luciferiano
T.M.T. Magus VI º