HARPAGO





Na ativa desde 2008, mesmo com diversas mudanças em sua formação, a Harpago segue firme no meio Underground, o que não é fácil para aqueles que não vivem exclusivamente de sua música. Alheia a tudo isso, a banda vem divulgando seu primeiro álbum de estúdio, “Paraíso Perdido”, lançado em 2020. Com sua sonoridade calcada no Heavy e Speed Metal da década de 1980 (mas sem se prender apenas a isso), inclusive, cantado em português, a banda supera os percalços, mudanças na formação e continua a fazer sua música. A formação, hoje, da Harpago é Cláudio Soares (baixo e vocal), Guilherme Incitatus (bateria) e Alex (guitarra). Na entrevista a seguir saberemos um pouco mais da história do Harpago, sua caminhada, álbum atual e planos futuros.
 
Recife Metal Law - Hárpago, general do período da Grécia Antiga (Século VI A.C.). Harpago, tipo de planta medicinal, também conhecida como “unha ou garra do diabo”. “Harpago”, música instrumental que abre o EP “A Ferro e Fogo” (1985) do Harppia. Esse último foi o que vocês usaram para nomear a banda. A escolha foi apenas por vocês gostarem da música, da banda ou da sonoridade do nome?
Cláudio Soares –
Saudações, amigos do Recife Metal Law! Esse nome é curioso, pois muitas pessoas atribuem ele a coisas distintas. Nossa escolha foi por conta da (música) instrumental da banda Harppia, tanto pela sonoridade do nome, quanto pelo símbolo e representação: um cavalo filho do Vento e das Harpias. Combinava muito com o período de início da banda. Usávamos esse contexto, de uma nova geração que “resgatava” aquela raiz do Metal brasileiro antigo, fazendo uma analogia com a lenda descrita no encarte do LP “A Ferro e Fogo”. Já procurei outras fontes que descrevessem a lenda que está neste encarte, porém é o único local onde vi, não sei de onde o Harppia tirou este texto, gostaria de saber. Quem batizou a banda com este nome foi o primeiro baterista, Fernando.

Recife Metal Law - Na ativa desde 2008, a banda já lançou diversos EPs e splits, antes de lançar seu álbum de estreia. Porém o primeiro material apenas foi lançado após quatro anos de a banda formada. Por qual razão o Harpago demorou tanto para lançar um material de estúdio?
Cláudio –
Tivemos problemas com estabilização de formação no início, pois formamos a banda ainda na época de escola, eu e o primeiro baterista, ele com 19 anos e eu com 17 anos. Todos que passaram pela Alada (esse foi o primeiro nome da banda, creio que por pouco mais de um ano) eram muito novos e/ou pouco comprometidos. O Harpago se estabeleceu de verdade como banda no início de 2011, quando o Roger entrou. Foi com a entrada dele que definimos as composições da primeira Demo; foi nesse período que resolvemos não ter vocalista, que um membro que tocava também iria cantar, até para ter menos pessoas na banda.
 
Recife Metal Law - Desde a formação até os dias atuais (a atual formação está junta desde 2019), a banda teve muitas alterações, ficando, da formação original, apenas o baixista/vocalista Cláudio Soares. O que ocorre para que se haja tantas trocas de integrantes? E como está a atual formação, no que diz respeito a entrosamento e criação musical?
Cláudio –
Só uma correção, o Caio, guitarrista que gravou o “Paraíso Perdido”, saiu no final de 2021. Atualmente estamos com um novo guitarrista, o Alex (ex-Devastação e ex-Angry). É muito complicado manter uma banda Underground sem que haja mudanças; as pessoas mudam, mudam seus focos, discursos, gostos, direcionamentos… não foram relações muito fora disso. Dos membros que passaram pela banda, pelo menos três deles continuam tocando no Underground, os outros pelo que sei, não tocam mais. O importante, para mim, é perceber que o Harpago continua firme e forte, fiel às raízes e as suas ideias. Nesse meio tempo aconteceram muitas coisas, mas estamos fortes e caminhando para nosso segundo álbum. Quanto ao momento, eu considero ele o melhor de todos, pois temos o suporte do nosso próprio estúdio e o comprometimento total dos três membros que estão na banda. Estamos compondo músicas juntos, está sendo uma ótima experiência. Eu, particularmente, prezo sempre pelo coletivo. Uma banda Underground, onde ninguém ganha grana, não pode ser diferente, a relação dos membros tem que ser de amizade e com clima de companheirismo. Se não rolar desta maneira, não tem porque tocar juntos.
 
Recife Metal Law - Os materiais lançados pela banda receberam diversos formatos. Além do inevitável digital, vocês lançaram em formatos como CD, K-7, vinil... Eu, mesmo, tenho diversos materiais do Harpago, em diversos formatos (K-7, CD e vinil). Quais desses formatos é o preferido por aqueles que querem escutar a música da banda?
Cláudio –
Creio que o principal sempre será o vinil, pelo menos para mim. Para o público em geral, o CD sempre é o mais viável, pelo preço e acessibilidade. Prezo por lançar em pelo menos dois formatos, fora o famigerado digital, que não considero esforço (nem lançamento). Nem preciso falar o porquê.

Recife Metal Law - O mais recente lançamento da banda é o álbum “Paraíso Perdido”, lançado pela Cianeto Discos. Os materiais da banda já foram lançados por diversos selos diferentes. Então, o que os fez chegar até a Cianeto Discos para lançar o ‘debut’ álbum e como vem sendo a parceria entre selo e banda?
Cláudio –
O “Paraíso Perdido” foi lançado pela ABC Terror em parceria com a Cianeto. Foi um processo natural. O Vinícius da ABC Terror havia assistido um show do Harpago e fez a proposta. Na época já tínhamos meio que um “acordo de boca” com outro selo, que acabou não virando por uma falta de comunicação e, posteriormente, de confusão. Com isso entrei em contato com o Vinícius e depois com o Gil da Cianeto, no qual os dois dividiram o lançamento. Também saíram 50 cassetes via Ataúde/Dor Presente. Até então, para nosso próximo lançamento, não temos nenhum selo fechado. Caso algum selo/Distro se interesse pelo nosso trabalho, é só entrar em contato.
 
Recife Metal Law - O álbum contém nove músicas e, se comparado aos trabalhos anteriores, tem certa diferença, apesar de o estilo praticado não ter mudado. Musicalmente, o que vocês queriam com o primeiro álbum?
Cláudio –
O “Paraíso Perdido” mantém a nossa veia Heavy Metal dos primórdios, porém com o acréscimo de outras influências e com a ideia de tentar soar cada vez mais com a própria identidade, coisa que é difícil nos tempos atuais para a maioria das bandas. Chegamos a um resultado bem satisfatório. Musicalmente escolhemos arriscar em sons mais rápidos e também um pouco mais elaborados. O som que mais eu destaco no quesito “arriscar” algo diferente, foi a “Balsa da Medusa”. Eu considero uma música ambiciosa, que aponta desde já para um caminho diferente do comum da banda, como também do comum reproduzido por bandas do mesmo estilo nesses últimos tempos. Eu considero um disco coeso, que passa sua mensagem sonora e lírica com clareza. Mesclamos aqui o tempo de experiência e tempo de estrada, e com a entrada do Guilherme Incitatus, deu uma outra cara para as músicas.
 
Recife Metal Law - Eu acredito que a produção desse álbum tenha sido fator principal para algumas mudanças, já que ele não soa como os lançamentos anteriores. Como foi o trabalho no Manillar Estúdio? A produção musical, neste álbum, era o que vocês queriam atingir?
Cláudio –
O Manillar Estúdio é nosso espaço particular, um estúdio coletivo de amigos, com a principal finalidade de produzir trabalhos dos envolvidos. Ele é indispensável para nossa melhora como músicos, como também na economia de gastos financeiros, desde ensaios a gravações. Talvez não tenhamos atingido totalmente o que queríamos, pois estamos em constante crescimento do estúdio, e os recursos melhoram com o tempo, porém ele foi feito com o máximo que era possível na época, e eu tenho um orgulho grande deste disco. Nós somos o tipo de pessoas que joga com o que tem, entende? E estamos em constante melhoria, tanto na banda, quanto no estúdio. Registrar essas mudanças e avanços é essencial, não apenas esperar o “momento perfeito”. A trajetória faz parte da história e ela precisa ser registrada, mesmo torta e com suas deficiências.

Recife Metal Law - Temas como “Libertação” e “Gaiola Cerebral” já haviam sido gravados em lançamentos anteriores do Harpago. Por qual razão vocês decidiram regravar tais músicas para o primeiro álbum?
Cláudio –
Optamos pela regravação das mesmas, pois as consideramos ótimas composições e precisavam estar em um contexto que elas pudessem ser mais bem executadas e gravadas. Creio que conseguimos tal feito. Inclusive, é bem provável que no próximo álbum haja alguma regravação.
 
Recife Metal Law - A parte lírica, sempre cantada em português desde o início, me chamou a atenção. As letras são bem escritas, abordando temas diversos e soam muito bem aos ouvidos, ainda mais daqueles que curtem Heavy Metal cantado em nossa língua. De onde surge a inspiração para as letras e por qual razão a banda decidiu usar apenas o português para cantar suas músicas?
Cláudio –
A escolha do idioma é simples: pensamos em português, nos comunicamos no dia-a-dia por ele. Fora isso, temos exemplos aos montes de bandas cantando em português e em tantos outros idiomas, com obras gravadas de extrema relevância. Inclusive, no início de todas, ou quase todas as cenas no mundo, cantava-se na língua materna, naquele lance “menos comercial”, que foi ficando pasteurizado com o tempo, e a língua entrou no meio, não apenas o som. Mas fora esse aspecto, cantar em português é marcar uma posição ideológica e cultural, contra o senso comum que coloca toda a arte e o Metal em uma única possibilidade. Nós somos do Terceiro Mundo, e nos expressamos à nossa maneira, condizente com a nossa própria realidade. Cantar em inglês seria fazer parte do jogo comercial/cultural do qual o Harpago foi concebido com ideia contrária.
 
Recife Metal Law - A única música em outra língua, contida no álbum, é “Fuego Cruzado”, que é um cover da ‘cult’ banda argentina Retrosatan. Quem teve a ideia de colocar esse cover no álbum e por qual razão?
Cláudio –
O antigo baterista, o Igor, junto comigo, tivemos a ideia. Eu sou um grande fã do Retrosatan e do Metal cantado em espanhol, e queria gravar algo mais “lado B”. Tivemos a permissão da banda para fazer essa gravação. Acho que enaltecer os que tiveram pouco reconhecimento no passado, como é o caso do Retrosatan, que gravou
apenas Demos, é uma maneira de agradecer a quem permeou esse árduo caminho nos primórdios, ainda mais se tratando da América Latina. Fora ser uma banda magistral!
 
Recife Metal Law - A capa de “Paraíso Perdido” é um belo desenho e parece ter sido feito à mão. Qual a inspiração para a arte e qual a ligação dela com o título do disco?
Cláudio –
A capa foi feita pelo artista Fernando JFL, que usou tanto parte digital quanto manual. O título e a capa refletem sobre a ideia de um paraíso arruinado, perdido. O cavalo simboliza a mascote da banda, em meio a uma cidade em ruínas, um lugar decadente, que não é mais habitável. Inclusive, o título é um conceito muito recorrente em literaturas e afins, tendo também a banda Paradise Lost... Claro que não é sobre um paraíso religioso que tratamos, longe disto, mas, sim, sobre um paraíso pessoal, algo que foi deixado no passado de alguma forma. O título é citado na música “Tempestade Demencial”, talvez ela seja a letra que mais bem retrate o cenário da capa. Não que estejamos cultuando essa ideia, de ficar preso ao passado, muito pelo contrário, sou contra esse saudosismo.

Recife Metal Law - Tendo em vista que os shows já voltaram a se realizar, como está a agenda do Harpago para os próximos meses?
Cláudio –
Nós ficamos quase dois anos sem ensaiar por conta da pandemia. Nosso único show desde de então foi em julho/2022, em Campo do Meio/MG, no “CDM Metal Fest”, que foi animal! Até então não temos nenhum show marcado. Preferimos que continue assim pelos próximos meses, pois estamos compondo o novo material e ensaiando ‘set’ de show atrapalha um pouco quando se está focado em compor para gravar.

Contatos: www.facebook.com/Harpagoheavymetal

Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação