O Violator tem apenas oito anos de atividades (surgiu em 2002), mas já carrega na bagagem muita experiência e diversos shows, inclusive fora do país. Em sua curta trajetória a banda já lançou uma Demo, um full lenght e dois EPs, além de ter dividido alguns splits com outras bandas. Certamente o Violator é uma das mais importantes bandas de Thrash Metal do Brasil, atualmente, e talvez isso se deva a forma como os músicos se comportam, tanto dentro como fora do palco. E por falar em palcos, os shows da banda sempre são carregados de muita energia, que contagia a todos. Desde o seu início, o Violator sofreu apenas uma mudança em sua formação (numa das guitarras) e o ‘line up’ atual conta com Pedro “Poney Ret” Arcanjo (baixo/vocal), Pedro “Capaça” Dias e Márcio “Cambito” (guitarras) e David Araya (bateria). Na entrevista a seguir Pedro “Poney Ret” nos fala um pouco mais sobre a recente história da banda, bem como sobre seu recente lançamento. Confiram! Recife Metal Law – Comecemos falando sobre o álbum “Chemical Assault”. Após quatro anos de seu lançamento, como vocês analisam a repercussão desse material e qual sua importância para recente história do Violator?
Pedro “Poney Ret” Arcanjo – Fala Valterlir, meu grande amigo! Primeiro deixe-me agradecer por essa entrevista. Obrigado pelo interesse, apoio e, principalmente, amizade ao longo desses anos. No fim das contas, é isso que vale. O Underground é uma grande rede de amigos, subterrânea e internacional. Porra, a repercussão do “Chemical Assault” foi muito melhor do que as nossas expectativas mais loucas! (risos) Na verdade, a gente nunca teve grandes pretensões com a banda. Desde que começamos, ainda muito moleques, o negócio sempre foi sobre tocar rápido e se divertir. Então, eu mal pude acreditar na recepção desse material. Com esse disco a gente conseguiu viajar por boa parte do globo, conheceu um monte de gente legal, lançamos em vinil e um monte de coisa. Sem dúvida, “Chemical Assault” é um marco nas nossas vidas.
Recife Metal Law – Com esse álbum, vocês tiveram a oportunidade de fazer muitos shows, tanto no Brasil, América do Sul, como Japão e Europa. A grande quantidade de shows se deve exclusivamente a receptividade desse álbum ou existe um conjunto de fatores para essa exposição do nome Violator ao redor do mundo?
Pedro – Boa pergunta, que talvez eu não seja a melhor pessoa para respondê-la, afinal estou falando de dentro. De qualquer maneira, esse tipo de fenômeno nunca possui apenas uma explicação, não é mesmo? É claro que a recepção positiva do disco foi muito importante pra que a gente tocasse em vários lugares diferentes do mundo. Acredito que a excelente estrutura e distribuição da Earache (que licenciou o álbum em 2008) também foi fundamental pra que muitas pessoas em países muito distantes tivessem acesso a nossa música. Acho ainda que a paixão louca que a gente tem por esse negócio de Thrash Metal também tem um peso importante nesse processo. A gente dá muito valor ao Underground e acredita muito nesse meio de produção do-it-yourself, às amizades nesse espaço. E eu espero muito também que essa paixão se reflita nos nossos shows, em que cada minuto é pra ser como se fosse o último das nossas vidas, como se o mundo fosse acabar em cada música. Não dá pra negar, também, que a gente vive um contexto geral de maior aceitação do Thrash Metal, coisa que a gente não via quando começou (na verdade o que havia era uma repulsa, né?), e que eu gosto de pensar que a gente ajudou a construir localmente, junto com bandas como Farscape, Bywar, Blasthrash, Municipal Waste, Toxic Holocaust, etc.
Recife Metal Law – E como foi a experiência de atravessar o mundo e ir parar no Japão? Vocês puderam conhecer muitos lugares na terra do sol nascente?
Pedro – Completamente surreal! Quando a gente começou a tocar, bicho, a gente não imaginava que um dia sequer faríamos um show aqui na nossa cidade. Desnecessário dizer que viajar pro outro lado do mundo era algo completamente inimaginável, impensável, inconcebível! E foi tudo sensacional, os shows foram ótimos, cheios de stage dive e circle pit. Ficamos muito amigo do cara que fez o show, Miki-MOSH. Ele inclusive viajou recentemente pra Zurique, Suíça, pra ver o show do Violator lá. Foi incrível isso. É legal porque mostra que a nossa contracultura Underground tem a capacidade de ultrapassar todas essas barreiras artificiais que a humanidade criou e que só servem pra separar a gente, como essa porcaria de nacionalismo. Gosto muito de uma banda chamada Conquest For Death, que diz: “Many Nations, One Underground!”. Além disso, tivemos o prazer de tocar com o Hirax, banda que eu cresci ouvindo e que se mostraram pessoas super humildes, sem nenhum resquício de estrelismo ou desse sentimento rock star, algo que devemos exorcizar da nossa cena.
Recife Metal Law – Agora falemos sobre o novo lançamento da banda, o EP “Annihilation Process”. Por que vocês demoraram tanto tempo (quatro anos) para lançar um novo material com músicas inéditas?
Pedro – Pois é, foram quatro anos, né? Mas esses quatro anos passaram voando pra gente! Olha só, nesses quatro anos, a gente teve: entrada do Cambito nas guitarras (e você imagina como uma entrada de um novo membro é um processo complicado, ainda mais no Violator que é uma banda guiada pelas seis cordas), uma turnê na América do Sul que durou quase um semestre, shows ininterruptos pelo Brasil, uma viagem pra Europa, uma viagem pro Japão... Quando a gente viu, já tinha passado tempo pra caralho! (risos) A gente até decidiu fazer um disco com menos músicas pra lançar mais rápido, os planos eram de ter tudo pronto em 2008, mas por uma série de fatores (que são bastante comuns no Underground) a gente não conseguiu aprontar tudo mais rápido. A gente se dedica pra caralho pra banda e fazemos isso com muito prazer, mas ainda assim todo mundo da banda trabalha de segunda a sexta-feira pra pagar suas contas. A gente grava em um estúdio por um preço camarada, mas ficamos refém dos buracos na agenda. A gente não manja nada de arte, mas fomos eu e o Capaça que fizemos todo o layout do disco... Esse tipo de coisa acaba enrolando o processo de finalização. Mas ‘tá aí, disco na mão e tudo beleza!
Recife Metal Law – Esse EP mantém a mesma proposta da banda, de fazer Thrash Metal como nos velhos tempos: violento, rápido, pesado... Mas mesmo assim carregando uma característica própria. A forma de o Violator compor sempre será assim? Nada de novas tendências em sua música?
Pedro – É isso que o Violator se propõe a fazer: violência Thrash Metal, sem frescuras. Isso tava escrito no nosso primeiro release em 2002 e as coisas, nesse aspecto, não mudaram desde então. Agora, eu acredito que isso não significa que o nosso processo de composição seja estático e/ou repetitivo. Pelo menos essa não é a nossa intenção. Acredito que a banda evoluiu/mudou/amadureceu muito desde “Violent Mosh” (2004) e a nossa intenção sempre foi conseguir chegar mais longe nos limites da insanidade Thrash. Você percebe essa mudança do primeiro EP para o “Chemical Assault” e eu acho que a gente segue o mesmo caminho nesse novo álbum. Então, eu acredito que o “Annihilation Process” traz uma banda mais agressiva, mais rápida e mais violenta. As letras, mais duras e mais críticas, também refletem isso, espero. Esse é um dos desafios de criar música cujas bases foram dadas há 25/30 anos. É muito fácil cair naquela coisa genérica, aquela música que não transmite nada a não ser uma mera sensação de deja-vu, sabe? “Ah, já ouvi isso antes”. Não quero dizer que a gente consegue fugir disso, mas esse é sempre nosso objetivo e sempre vai ser. Fazer, em 2010, Thrash Metal ‘Old School’ que ainda soe relevante e surpreendente, entende?
Recife Metal Law – Algumas músicas desse novo trabalho beiram a insanidade Hardcore, como é o caso do esporro sonoro “Give Me Destruction Or Give Me Death”. Fazer música com uma ‘pegada’ mais Hardcore foi proposital?
Pedro – Achei curioso você ter identificado ela dessa maneira. Talvez tenha sido pela maneira como encaixei o vocal, que tenha passado essa pegada mais ‘thrashcore’. De qualquer maneira, essa música foi trazida quase que inteiramente pelo Cambito, que é um cara que nem escuta tanto Hardcore assim, e a ideia dele era fazer uma música que soasse como aquelas bandas mais agressivas da história do Thrash, aquelas bandas que estavam ultrapassando os limites da velocidade Thrash, como o Sadus, o Schizo ou o Kreator do “Pleasure to Kill”, sabe? Eu, particularmente, acredito que ela possui até umas passagens que remetem mais ao Death Metal, com aquelas guitarras com a palhetada ‘zunida’. Seja como for, eu gosto muito da abordagem direta e na cara dela. Acho que ficou um atestado de raiva aquilo ali. (risos)
Recife Metal Law – As letras contidas em “Annihilation Process” são duras críticas a forma como a sociedade vem destruindo o mundo. Mas quem são os maiores culpados por toda a destruição ao nosso redor, na opinião de vocês? O que poderia ser feito para se melhorar?
Pedro – Os principais culpados somos nós. Não há ninguém pra se colocar a culpa além da própria humanidade. Eu rejeito qualquer ideia de deus ou ser transcendente que tome decisões por nós. As escolhas são feitas por pessoas como nós e toda a miséria do mundo vem daí. Esse modo de organização social, baseado na competição, na hierarquia, na autoridade é responsável por muita morte e dor. Vivemos num mundo que transforma tudo em produto, pessoas inclusive, que incentivam o consumo como objetivo de vida e que excluiu boa parte da população desse processo. O resultado dessa equação não pode ser outro a não ser opressão e violência. Sei que não posso ser considerado o maior dos otimistas. Mas ao mesmo tempo, tenho noção de que acreditar que nada tem solução é a estratégia que melhor serve aos donos do poder. Quando você acha que ‘tá tudo perdido e que não adianta fazer nada, você paralisa o presente e assegura a destruição. Eu não tenho a pretensão de dizer a ninguém o que cada um deve fazer, isso quem gosta de fazer são os pastores, mas é claro que eu acho que existem muitas coisas que podemos tentar pra reverter esse quadro todo ou pelo menos pra resistir. Nenhuma dessas coisas passa por esperar que a política tradicional resolva os problemas. A política institucional é um jogo de cartas marcadas cujo vencedor nunca vai ser a população. Isso não significa que eu partilhe dessa posição ‘não me importo com a política’, pelo contrário, acho que devemos buscar maneiras de nos articular para transformar nossa realidade local e isso sim é política no sentido estrito, não apertar um botão de quatro em quatro anos e esperar que alguém tome todas as decisões por você. Talvez uma boa maneira de começar seja mudando a gente mesmo, nossa forma de pensar, nossa forma de agir. Acho que muitas vezes os impactos de pequenas mudanças podem reverberar muito e são atitudes muito subestimadas, ‘que não faz diferença’. Pelo menos estamos tentando.
Recife Metal Law – “Apocalypse Engine” tem suas letras baseadas no livro “Apocalipse Motorizado”. Creio que a ideia de colocar uma música com letras baseada nesse livro tenha partido de você, em razão de tuas atividades no meio ciclístico. Estou certo?
Pedro – Está certíssimo, Valterlir. Nos últimos anos eu passei a me envolver mais com pessoas que andam de bicicleta e utilizam isso pra pensar a organização das cidades e comecei a refletir muito sobre o tema da mobilidade urbana. A gente vive numa sociedade (ditadura?) do automóvel, e se atentar a esse fato parece muito significativa pra entender as dinâmicas opressivas da nossa sociedade. Além de alimentar a indústria do petróleo (a gente precisa comentar o quão criminosa essa indústria pode ser?) o carro é um meio de transporte individual que tem transformado nossas cidades em lugares insustentáveis. Em Brasília, a gente sente isso fortemente. Essa nossa cidade é a cidade da segregação, quem conhece, sabe. A rua não é um espaço público de encontro, é apenas uma via expressa pros automóveis (isso mata muito gente, inclusive). O sistema de transporte público é péssimo, o pior que eu conheço no mundo, e querem que seja assim mesmo justamente pra impedir que as camadas mais pobres da população de terem o mesmo acesso à cidade de quem tem grana. Eu confesso que até pouco tempo eu era dependente do automóvel. Recentemente me desfiz do carro e tenho feito todos meus percursos na cidade de ônibus, bicicleta ou a pé. De vez em quando a gente passa um aperreio (ontem mesmo fiquei até as 11 da noite esperando um ônibus e nada), mas o prazer de se viver aquilo que se acredita é bem maior. A gente acabou de chegar da Europa, e lá você vê investimentos maciços em infraestrutura pra bicicletas nas cidades. O resultado disso são ambientes urbanos bem mais agradáveis, menos poluídos, lugares em que a gente pode viver. Aqui, a gente caminha na contramão: cada vez mais concreto, mais poluição e, claro, mais consumo. Dinheiro é o que manda.
Recife Metal Law – A capa mostra uma cidade sendo destruída, mas de dentro (da terra) pra fora, trazendo uma tonalidade roxa. O que vocês quiseram retratar com essa capa, que foi desenhada por Andrei Bouzikov?
Pedro – A gente passou toda a ideia do disco pro Andrei e pedimos pra ele criar algo em cima disso. Ele veio com essa ilustração, que me parece uma bela imagem-síntese do conceito do álbum, uma espécie de caveira-foguete, que aniquila tudo que deixa pra trás. O que está ali é isso: devastação, morte e horror, mas não causados por algo desconhecido e sim pela nossa própria ânsia de progresso e enriquecimento a qualquer custo.
Recife Metal Law – O EP ainda conta com um cover para “You’ll Come Back Before Dying” do Executer, que ganhou uma versão bem própria. Essa música foi só uma forma de homenagear o Executer ou a sua inserção no EP se deu por outra razão?
Pedro – Foi basicamente uma forma de homenagear o Executer, uma de nossas bandas favoritas e que conta com alguns dos caras mais bacanas que já tiveram uma banda de Metal. Acho que temática da música até se encaixa com o conceito do álbum, mas o que a gente queria mesmo era agradecer a esses caras por tudo que eles fizeram e fazer com que essas músicas incríveis que eles criaram há 20 anos chegassem a mais pessoas jovens como a gente. Legal falar que a primeira vez que a gente tocou com o Executer foi aí em Pernambuco. Foi um ‘rolê’ inesquecível. Depois disso, eles viraram uma espécie de ‘padrinhos’ da gente. (risos)
Recife Metal Law – Esse ano, além do EP, vocês participaram de mais dois split: um intitulado “Thrashing The Tyrants” ao lado do Bandanos e outro intitulado “Raging Thrash” ao lado do Hirax. Ambos contêm músicas que estão no EP. Por que não colocar músicas inéditas nesses splits?
Pedro – O split com o Bandanos seria só de músicas inéditas. A gente acabou optando por colocar “Uniformity is Conformity” no “Annihilation Process”, pois acreditamos que o EP ficaria mais completo assim. Comentamos a ideia com as gravadoras responsáveis pelo split e eles acharam que não teria problema devido aos formatos distintos. O split com o Hirax foi combinado de maneira muito rápida e a ideia era apenas celebrar aquele encontro que tivemos no Japão. Nem nós nem os americanos teríamos tempo de gravar coisa nova, então foi assim mesmo. É uma edição limitadíssima, de qualquer maneira. Eu gostaria de ter mais tempo e estrutura pra gravar e fazer mais músicas novas, mas esse é um problema que já expliquei antes aqui na entrevista. Seja como for, esses registros valem mais pelo prazer de compartilhar um disco com amigos do que qualquer outra coisa.
Recife Metal Law – Voltando a falar sobre shows, quando a banda voltará a tocar na Região Nordeste? Faz tempo que vocês não pisam por aqui...
Pedro – Sei que pode não parecer, mas falo isso sem hipocrisia: o nordeste é o melhor lugar do mundo pra tocar. Os shows são brutalmente animados, você não precisa tocar todo dia, as pessoas são muito gente finas e o melhor: tem praia! (risos) Gostaria muito de voltar para uma turnê completa, como fizemos em 2005 e em 2007, espero que a gente consiga no futuro. De qualquer maneira, temos feito visitas rápidas a região nos últimos tempos. Fomos a Fortaleza, Teresina e São Luís. Sempre bom pra caralho tocar aí!
Recife Metal Law – Foram quatro anos sem um novo lançamento, então o que podemos esperar após o lançamento de “Annihilation Process”?
Pedro – Eu é que tenho esperanças que a gente não demore mais tanto tempo pra lançar um novo material! (risos) E a gente não vale um centavo pra que alguém tenha esperança de alguma coisa com a gente! Não percam o seu tempo! (mais risos) Obrigado a você, Valterlir, e obrigado a todo mundo que sempre apoiou e apóia o Violator. Mantenham o espírito underground! UFT!