Segue depoimento do vocalista Andre Matos sobre o falecimento de Dio:
“O Deus Humano”, por Andre Matos
Neste momento em que todos estamos sentindo a falta de Dio e vários músicos vêm prestando suas homenagens e tributos, gostaria de falar sobre o lado humano de Ronnie.
Conheci Dio no México, na cidade de Monterrey. Na ocasião éramos uma das atrações de um festival que reunia, entre outros, Twisted Sister, Quiet Riot, Dokken e Dio. Na chegada ao aeroporto, ao aguardar as bagagens junto à esteira, eis que se aproxima um ser de porte mínimo - porém de carisma inconfundível. Dio me estende a mão como se fôssemos velhos amigos: “How are you?"... Confesso que fiquei um pouco paralisado, sem saber o que responder naquele instante. “Fine, and you?” - devo ter dito. Realmente não lembro quase nada desse diálogo. Ao mesmo tempo em que me encontrava cara a cara com uma das poucas lendas vivas do Rock, podia perceber a naturalidade e a gentileza com que Dio se dirigia às pessoas. O que, de certa forma, me tranquilizou: passamos então, bons 20 minutos conversando sobre vários assuntos antes de partir para o hotel. Mas a maior surpresa estava reservada para o dia seguinte: por um capricho do acaso - ou da assessoria de imprensa do festival - fui escalado para, juntamente com Dio, percorrer os principais canais de televisão e rádio, para juntos fazermos a divulgação do evento. Foi aí que conheci a pessoa por trás do mito.
Passamos o dia inteiro indo de um lugar a outro, almoçamos e jantamos juntos, e tempo não faltou para que Ronnie me contasse várias das incríveis passagens de sua vida. Surpreendeu-me por diversas vezes ao insistir para que eu respondesse a várias das perguntas que eram dirigidas a ele nas entrevistas. Surpreendeu ainda por seus atos de gentileza, tais como puxar a cadeira para alguém sentar ou ajudar alguém a vestir a jaqueta. Ronnie não precisava fazer isso. Mas fazia questão. Aquele pequeno homem impressionava pela vitalidade.
No dia do show, desnecessário dizer que a sua apresentação foi, de longe, a melhor da noite. Assisti da primeira fila e me emocionei ao lembrar meus primeiros anos no Metal. Nunca cantamos juntos no mesmo palco - mas naquele momento, cantei junto todos os seus hinos, da plateia. Foi um dos melhores shows que já assisti.
A notícia do câncer de Dio foi ao mesmo tempo triste e enfática. Todos nos orgulhávamos de que o Metal parecesse imortalizado na figura de Ronnie. Sempre foi um alento para qualquer vocalista saber que poderíamos envelhecer como Dio - e com a voz intocada! Mas, nesse caso, nem mesmo Deus (Dio, em italiano) é imortal. A hora chegou para o nosso ancião.
Dio morreu aos 68 anos: foi e será um dos maiores exemplos de integridade neste meio musical, um cara simples e humano, um monstro sagrado.
E, se fosse possível falar com os mortos, como nos sonhos, certamente estenderia a mão para ele como um velho conhecido e perguntaria: “How are you?”... “Fine, very fine”, ele responderia!