Há muito tempo eu estava querendo fazer uma entrevista com o Hibria, uma das mais importantes banda de Heavy/Power Metal da atualidade, inclusive tendo tocado no ano passado no Rock In Rio. Apesar de toda essa importância que essa banda, principalmente em terras japonesas, o Hibria ainda não conseguiu um grande reconhecimento em seu país, já que nunca teve a oportunidade de fazer uma turnê no Brasil (assunto abordado na entrevista). Mas isso não significa que a banda se curvou perante os percalços e continua fazendo sua música de qualidade. Atualmente o Hibria divulga seu mais recente lançamento, o aclamado “Silent Revenge”. Na longa entrevista a seguir (respondida pelo guitarrista Abel Camargo e pelo vocalista Iuri Sanson) vários tópicos foram abordados, dando uma geral na carreira da banda. Os demais integrantes do Hibria são: Renato Osório (guitarra), Benhur Lima baixo) e Eduardo Baldo (bateria).
Recife Metal Law – O Hibria foi formado em 1996, e um ano depois já lançou sua primeira Demo, “Metal Heart”. Vocês ainda lembram como foi o processo de composição dessa Demo e trabalho no estúdio?
Abel Camargo – A gente se reunia em algum lugar para tocar e trocar ideias sobre as músicas. Depois que elas já tinham uma estrutura mais definida, a gente tocava em estúdio. A gente tentava acertar o máximo de detalhes antes para poder aproveitar o tempo de estúdio tocando, porque as salas de ensaio eram, e continuam sendo, muito caras.
Recife Metal Law – O início das atividades da banda se deu sem a presença do vocalista Iuri Sanson. Este veio a fazer parte do Hibria dois meses antes das gravações da primeira Demo. Antes da entrada do Iuri a banda já havia definido seu som, ou a entrada do vocalista foi quem ajudou a definir como vocês queriam soar?
Abel – A entrada do Iuri foi essencial para o crescimento do Hibria e isso se deve ao fato de ele ser um cara de fácil convivência (característica essencial na longevidade de qualquer banda) e de ter um excelente caráter (coisa que falta para muito músico no Brasil e no mundo). Além de ele ter agregado uma voz potente e com um timbre muito particular ao som do Hibria; a interpretação dele em cada música da banda é um espetáculo à parte. Creio que a definição do som do Hibria se deu a partir da entrada dele também. Muitas músicas que nem chegaram a entrar em Demos já tinham sido compostas antes da entrada dele, mas não foram lançadas, apesar de terem sido tocadas ao vivo. Essa pergunta sobre a entrada do Iuri me fez lembrar o review que recebemos para a “Metal Heart” na época do seu lançamento, publicado por uma grande revista de música aqui do Brasil na época. O então resenhista disse que a banda era boa, que as músicas eram legais, mas que era uma pena que o vocalista, senhor Iuri Sanson, “desafinava sem dó”. Hoje, 17 anos após o lançamento da nossa primeira Demo, o Iuri é um dos melhores vocalista de Metal do mundo, e o Hibria umas das bandas mais fortes do nosso estilo no cenário Metal mundial, sendo que somos a banda brasileira mais importante no Japão, atualmente. O que fica de “lição” dessa resenha é que o mundo está cheio de resenhistas tendenciosos e covardes, e que uma banda tem que acreditar no seu som e seguir em frente, apesar das críticas. Essa mesma revista costumava publicar “resenhas engraçadinhas” e a gente também viu muita banda boa ser motivo de piada pela falta de percepção dos seus resenhistas em enxergar as coisas legais da banda e não saber incentivar as bandas a superarem suas dificuldades, seja no campo da composição, técnica, visual ou de qualquer outra coisa. O resultado dessa atitude de merda em relação às bandas que estão começando, ou até mesmo já estão no cenário há algum tempo, é enfraquecer a própria cena local. Resenhar um trabalho de uma banda é algo muito sério e deve ser feito por pessoas imparciais e que possuam o mínimo de caráter. Música é trabalho para gente séria e merece respeito. Desde as bandas que estão começando até as bandas que já estão no cenário profissionalmente.
Recife Metal Law – A banda, apesar dos vários anos de atividades, teve poucas mudanças em sua formação. Como é a convivência dos músicos do Hibria, e a ‘fórmula’ para que um ‘line up’ não tenha tantas baixas no decorrer dos anos?
Iuri Sanson – Primeiramente, a amizade. Não somos apenas músicos que nos encontramos nos ensaios ou eventos. Trabalhamos juntos e descontraímos fora do ambiente de trabalho, apesar da agenda cheia de compromissos da banda e pessoais. Depois é a liga que se forma trabalhando e planejando o futuro da banda. Cada passo que damos é muito bem planejado em todos os sentidos. Também não posso deixar de citar o respeito que temos na banda. Temos muito respeito uns pelos outros como pessoas, antes de tudo, e também como músicos. Ninguém é melhor do que ninguém e todo mundo contribui com a banda de uma maneira ou outra.
Recife Metal Law – “Defying the Rules” foi o álbum de estreia da banda, e recebeu diversas críticas elogiosas à época de seu lançamento. A aclamação desse álbum foi essencial para o sucesso do Hibria?
Iuri – Sem dúvidas. “Defying the Rules” foi um marco na carreira do Hibria. O álbum foi lançado no Japão e ficou durante seis meses como o CD mais vendido pela maior cadeia de lojas deles lá, a HMV, fora ter sido lançado no Brasil, EUA, Canadá, Europa Ocidental, Rússia, Países Bálticos, Taiwan, Coreia do Sul e Hong Kong, abrindo as portas para o Hibria no continente Asiático, e no mundo. Esse álbum está completando 10 anos agora em 2014 e pretendemos fazer alguma surpresa para não deixar esta data passar em branco.
Recife Metal Law – Por falar em sucesso, a banda já tem muitos admiradores, inclusive na Europa e em alguns países asiáticos. Como foi que a banda conseguiu toda essa projeção e como foi trabalhada a parte de divulgação do nome do Hibria?
Iuri – Após o “Defying the Rules”, lançamos o “The Skull Collectors” em 2008 e em 2009 tivemos a chance de fazer nossa primeira tour na Ásia tocando no Japão (Osaka e Tóquio), Coréia do Sul, Taiwan e Hong Kong. Após isso voamos direto para o Canadá, cruzando o país de costa a costa, tocando em 11 cidades. No mesmo ano, fomos convidados para tocar no maior festival de Heavy Metal da Ásia, o Loud Park. Dessa forma, cravamos a bandeira do Hibria no Japão. Em 2011, após o lançamento do “Blind Ride”, fizemos a nossa terceira turnê que passou por Osaka, Nagoya e Tóquio (onde gravamos nosso DVD “Blinded by Tokyo”), tocamos na China pela primeira vez, em Shanghai, e firmamos ainda mais nosso nome por lá. Em 2012 fomos convidados novamente para tocar no Loud Park e, em 2013, fizemos nossa quinta turnê no Japão em cinco anos, e retornamos para a China dessa vez em Shangsha. Creio que todos esses fatos citados expliquem o porquê do Hibria ser o nome mais forte do metal do Brasil no Japão atualmente. Abel – Um lance que não posso deixar de citar e agradecer é o fato do Hibria ter crescido pelo “apoio popular”. Viemos do Underground e temos muito orgulho disso. Não fomos “fabricados” pela mídia, empresários e ninguém é filho de papai na banda para ficar pagando para abrir shows ou comprar espaço em revistas. Crescemos “na luta” mesmo. Sempre trabalhamos duro para fazer a banda crescer e tiramos muito dinheiro do nosso próprio bolso durante o início da nossa carreira para investir no Hibria, porque sempre acreditamos na força do nosso som.
Recife Metal Law – O mais recente lançamento é o excelente “Silent Revenge”, que veio para firmar de vez o nome do Hibria como um dos mais importantes no cenário brasileiro. Houve algum tipo de pressão para fazer um álbum que fosse superior aos anteriores?
Iuri – Muito obrigado! Buscamos superar o anterior a cada álbum e o mais interessante é que sempre procuramos fazer um tipo de som que nos dê satisfação de tocá-lo ao vivo, e não algo que apenas fique bom no CD. Ficamos livres para achar o direcionamento do álbum e, após isso, fechamos a concepção e procuramos a atmosfera perfeita para o show, o ‘set list’ ideal para cada oportunidade. O que mais gostamos de fazer é tocar ao vivo. Ver o pessoal cantando e suando a camiseta junto com a gente durante o show. Logo não podemos fugir disso. Estamos cada vez mais pesando a mão e deixando o nosso Power Metal ainda mais pesado, rápido e virtuoso.
Recife Metal Law – Com relação ao álbum anterior, “Blind Ride”, esse “Silent Revenge”, mesmo mantendo as melodias em alta, veio mais pesado e agressivo que o anterior. Na verdade achei que o novo CD é uma boa mescla de tudo que o Hibria já fez em sua carreira. Como a banda trabalhou nas composições desse novo lançamento?
Abel – “Silent Revenge” é a expressão dos nossos sentimentos, tanto no som quanto nas letras, com certeza. Acho que o álbum faz um apanhado geral da carreira do Hibria até o presente momento. A gente sempre tenta mesclar as coisas que a gente mais curte nos álbuns anteriores com coisas que estamos curtindo no momento. Creio que esse seja o CD com a atmosfera mais ‘ao vivo’ da banda. As músicas começaram a ser escritas por mim e eu ia mandando as ideias para o pessoal da banda para a gente ir fechando o conceito do som e eles irem acrescentando as suas ideias e arranjos. Também gostaria de destacar o trabalho do nosso baterista, o Eduardo. O cara mandou várias bateras ‘ducaralho’ que inspiram várias músicas. Quando o Renato entrou para a banda, começamos a tocar as músicas em estúdio para sacar como elas soariam ao vivo e isso fez com que coisas muitos legais fossem criadas com a banda tocando junto, improvisando e se divertindo muito no processo de composição. Todos os membros contribuíram de uma forma ou outra dentro do processo de composição de forma que a gente chegasse em “Silent Revenge”. Já estamos compondo o novo álbum e tenho certeza de que o nosso próximo trabalho vai superar as expectativas dos nossos fãs. O próximo CD do Hibria vai ser o primeiro registro que vamos lançar com a mesma formação e estamos muito empolgados com isso e com as novas composições.
Recife Metal Law – Prova dessa agressividade é a participação de André Meyer, da banda de Thrash Metal Distraught, nas músicas “Silent Revenge” e “Silence Will Make Your Suffer”. Tais músicas pediam vocais mais agressivos e o de André eram os mais indicados para fazer parte das mesmas?
Iuri – Sim, a gente pensou em colocar vocais mais agressivos e o André fechava perfeitamente na proposta que a gente tinha para essas partes. O Distraught é uma banda ‘ducaralho’ e somos muito amigos. Foi um caminho natural convidar o André para participar das duas músicas e também fazer alguns shows com a gente cantando essas partes ao vivo.
Recife Metal Law – Nem por isso a banda deixou momentos, digamos, mais amenos, o que é ouvido em “Shall I Keep on Burning?”. Vocês acham que alternar momentos agressivos e mais melódicos faz com que a banda adquira mais fãs?
Abel – O Hibria nunca se prendeu e não creio que vá se prender a um único estilo. A gente toca o que a gente curte e isso faz com que o nosso som seja único. A ideia da “Shall I Keep on Burning?” surgiu do Iuri cantando e tocando violão. É algo verdadeiro e orgânico. Não foi uma música composta para atingir mais público. A gente curte muito esse som tanto é que um clipe para ela já foi gravado e em breve será lançado. Fora a questão musical, a música tem uma letra muito forte. Quem viu o filme “O Segredo dos Seus Olhos” vai entender bem a ideia, assim como quem assistir ao clipe da música. Quando algo terrível e irreversível acontece com a gente, ou com alguém muito próximo da gente, “Shall I Keep on Burning?”
Recife Metal Law – A música mais longa da carreira do Hibria aparece justamente no novo álbum. Como foi a construção de “The Way It Is”? Vocês achavam que o Hibria tinha que ter uma música longa em sua discografia, por isso compuseram “The Way It Is”?
Iuri – Na realidade, temos uma música tão longa quanto essa que é a “Wings of Wax”, do nosso segundo CD, “The Skull Collectors”. A gente acabou desenvolvendo toda a parte de solos tocando juntos em estúdio, o que fez com que ela ficasse mais longa. A gente não limitou tempo ou algo do tipo, mas, sim, fomos apenas sentindo o rumo que o som ia tomando com a gente improvisando a partir do que já estava composto. O legal desse som é que todo mundo acrescentou alguma coisa a ele, fazendo com que ele se tornasse algo único. Nem sempre a gente consegue tocar esse som ao vivo, por uma questão de tempo de ‘set’, mas ele é um dos sons favoritos de todos no álbum.
Recife Metal Law – Apesar de não ser um álbum conceitual, “Silent Revenge” traz em sua temática lírica músicas que parecem ser interligar. Estou certo fazendo tal afirmativa?
Abel – Sim, a afirmativa procede. As letras do “Silent Revenge” foram inspiradas num filme chamado “o Segredo dos Seus Olhos”, que é espetacular, diga-se de passagem. Quem quiser entender mais sobre o conceito lírico do álbum, está convidado a assistir ao filme. O tema central gera em torno do sofrimento de um cara que perde sua amada brutalmente assassinada. O filme é forte, denso e faz a gente refletir sobre muitas coisas do nosso cotidiano.
Recife Metal Law – Novamente um álbum do Hibria é lançado no Brasil pela Voice Music. Como vem sendo a parceria com esse selo?
Iuri – A gente tem uma longa parceria com o Sílvio e a Voice. A gente entende as dificuldades do mercado, mas a Voice sempre nos apoiou a cada lançamento.
Recife Metal Law – Já no exterior vocês contam com a distribuição dos selos King Records e AFM Records. Como vem sendo a divulgação e distribuição de “Silent Revenge” fora do país e como o público tem recebido o disco?
Iuri – O público e a mídia têm recebido o álbum de forma excepcional. Estivemos no Japão pela quinta vez no ano passado, 2013, e pudemos sentir de perto a emoção do público ao ouvir as músicas do “Silent Revenge” ao vivo. Tocamos oito músicas dele e a reação do público foi excelente. Prova disso, também, foi que ficamos entre os melhores na edição da revista japonesa mais conceituada, a Burrn!. Figuramos entre os melhores lançamentos e os músicos do Hibria nas suas respectivas categorias. A mídia também nos deu um ótimo feedback em relação ao CD, coisa que pudemos constatar em entrevistas para as maiores publicações do Japão como a Burrn! e a Young Guitar, duas das revistas mais conceituadas e importantes do mundo.
Recife Metal Law – A banda já foi convidada para abrir shows do Metallica e Megadeth, além de fazer turnês pela Europa, Ásia e tocar no Rock In Rio, mas nunca fez uma grande turnê pelo próprio país. O que falta para que isso aconteça?
Abel – Que a banda seja mais reconhecida no Brasil e que os produtores se interessem em levar a banda para tocar Brasil afora. Já tocamos cinco vezes no Japão, abrimos os shows do Metallica, dois do Ozzy, ambos no Brasil, Megadeth, no Japão, temos um DVD gravado em Tóquio, coisa que nenhuma brasileira tem, pelo o que a gente sabe, já tocamos inclusive na China, primeira banda de Metal do Brasil a tocar lá, mas por aqui a coisa é diferente de alguma forma. Temos MUITA vontade de tocar no Brasil inteiro e estamos trabalhando muito para que isso aconteça. Vamos tocar no Abril Pro Rock pela primeira vez, e isso é um grande sonho que estamos prestes a realizar. Esperamos que esse show seja memorável e que abra portas para o Hibria fazer a sua primeira tour no Nordeste, com um show longo, pesado e com muita energia.
Recife Metal Law – O ano de 2013 foi de muitas conquistas para o Hibria. E o que a banda almeja para 2014?
Iuri – O ano de 2013 foi um divisor na carreira do Hibria, mas queremos muito mais. Já estamos compondo o nosso novo álbum e assim que possível divulgaremos mais informações sobre isso. Nosso primeiro CD, “Defying the Rules”, completa 10 anos do seu lançamento no Japão esse ano e também estamos pensando em fazer algo especial para celebrar isso. O que o Hibria mais quer em 2014 (e sempre!) é tocar ao vivo, tanto no Brasil como no mundo. Então, toda a ajuda é bem-vinda. Divulgue a banda para os seus amigos, entrem em contato com os produtores de suas cidades pedindo um show do Hibria, curtam nossa página no Facebook, siga nosso twitter @Hibria e o instagram.com/HIBRIAOFFICIAL. Invada o nosso guestbook no site www.hibria.com e deixe mensagens para o mundo todo falando que você viu o nosso show. Temos muito orgulho de termos alavancado nossa carreira com o apoio dos fãs e esperamos que continue assim.
Entrevista por Valterlir Mendes
Fotos: Divulgação, Karina Kohl