Fazia um tempo que o Recife Metal Law não entrevistava o Malefactor, mas, aproveitando que a banda, depois de quase uma década, voltará a tocar em terras pernambucanas, dessa vez no tradicional festival Abril Pro Rock, aproveitei o ensejo para falar, não só da nova passagem dos baianos por esses lados, mas também de lançamentos anteriores, do novo álbum, “Sixth Legion”, mudanças na formação , entre outros tópicos. Lembrando que, hoje, o Malefactor é Lord Vlad (vocal/baixo), Danilo Coimbra e Jafet Amoêdo (guitarras), além do baterista Daniel “Beans” Falcão, que é o mais novo membro da banda. Sem mais delongas, vamos à entrevista.
Recife Metal Law - O Malefactor vem numa boa sequência de lançamentos, inclusive tendo lançado antigos álbuns em conjunto: “Barbarian/Centurian - Special Edition” em 2008 e “Celebrate Thy War in the Darkest Throne” em 2016. Mas por que fazer os lançamentos dessa forma e não o relançamento de cada álbum, de forma individual, como é o habitual?
Lord Vlad – Saudações Valterlir & Recife Metal Law Zine. HAIL! Foram escolhas feitas entre nós e os selos, com capas extras (mantendo as originais no encarte), ‘bonus tracks’. Eu prefiro CDs “individuais”, mas não vejo problemas, já que os encartes são enormes nestes relançamentos e ficam diferentes dentro da coleção. Muitos tem todas as versões. No momento estamos analisando o relançamento do “Anvil of Crom” em Portugal, junto com um DVD documentário de bônus, ficando mais uma vez um CD diferente, porém lançando o disco isoladamente. Até para valorizar os Metalheads que apoiaram a versão simples.
Recife Metal Law - Tais lançamentos receberam novas capas. Fora isso, o que mudou com relação aos lançamentos originais?
Lord Vlad – As capas são diferentes, mas mantivemos as capas originais internamente. São CDs duplos, teríamos que optar qual disco seria a capa, e não tem lógica... Ao nosso ver, é um lançamento duplo. Algumas bandas preferem escolher um dos discos como capa e o outro no fundo, e o comprador escolhe qual capa será a da frente. São apenas formas diferentes de lançamento, e eu como colecionador gosto de um mesmo álbum com formatos diferentes.
Recife Metal Law - Antes de adentrarmos ao mais recente álbum, falemos do “Anvil of Crom”, lançado em 2013. Como foi o respaldo desse álbum junto à mídia e ao público? Quais foram as suas principais conquistas?
Lord Vlad – Para muitos Metalheads este foi o disco mais completo musicalmente da nossa fase como sexteto. Porém foi também a nossa fase mais conturbada internamente. Quase não fizemos shows de divulgação deste álbum; os lançamentos prometidos no exterior não se concretizaram, e a banda, por vários motivos, acabou se dividindo e três músicos saíram. A maior conquista, com certeza, foi o retorno que temos nos shows das músicas “Elizabathory” (que teve um clipe muito bem produzido) e “Anvil of Crom”. Fizemos um clipe também para “Blood of Sekhmet” que, acredito, retornará reformulada aos shows. Eu gosto muito de todos os nossos discos, que já são seis, porém o “Anvil of Crom” é especial para mim. Ele, na verdade, são dois discos em um só, pelo tamanho. É um disco “anticomercial”, porque hoje muitos querem músicas mais curtas, ou menos complexas, e ele tem músicas enormes, com dezenas de mudanças de tempo e clima dentro das músicas. Ele é muito rico e, portanto, bem diferente, olhando para boa parte da produção nacional (não é uma crítica ao Metal nacional, apenas uma análise de caso), que preferem a estrutura da música extrema mais (anos) 80, com riffs mais repetidos e primitivos. Escola de onde viemos também e que somos adoradores. Nesta banda, Malefactor, a proposta é mesclar musica satânica extrema com Metal tradicional e algumas passagens Folk/épicas. Fora da banda ouvimos - e tocamos - Death, Doom, Heavy, Thrash e Black Metal em outras bandas/projetos que fazemos parte e que são mais contidas à raiz dos estilos.
Recife Metal Law - Uma das curiosidades desse álbum foi a música “A Guerra Virá”, que até hoje é a única música do Malefactor cantada em português. Como foi essa experiência? Ainda existe a possibilidade de, num futuro, lançar algo em nossa língua, novamente?
Lord Vlad – Nunca paramos para falar novamente sobre isso. “A Guerra Virá” tem letra minha e da Susane Hécate (Miasthenia) e participação dela cantando comigo. Será uma honra cantar ao vivo esta música com ela algum dia. Sempre fui muito fã do Metal brasileiro em português, seja Heavy, Metalpunk ou Black Metal. Hoje já temos bandas cantando nas línguas indígenas. Quem sabe não nos aventuramos assim um dia? Não temos tantas barreiras no Malefactor. Soando adequado e respeitando as tradições Metálicas, porque não fazer? Tenho lido alguns poemas brasileiros e portugueses e pensado seriamente nisso como portas para o futuro.
Recife Metal Law - O mais recente álbum se trata de “Sixth Legion”, lançado em 2017. O título, claramente, faz alusão a ser o sexto álbum de estúdio da banda. O título foi meramente escolhido por tal razão ou houve outro motivo?
Lord Vlad – Este título tem vária interpretações. É nosso sexto álbum; Legion é um demônio que aparece na bíblia como possuindo corpos de homens e porcos, me soando bem macabro para um título. As letras deste disco são puro suco de enxofre, sangue, fogo e morte. Legião também é um conjunto de demônios. Gosto de absolutamente tudo neste disco, a começar pelo título.
Recife Metal Law - A banda, em seus álbuns, sempre trabalhou como sexteto (fora alguns convidados), só que nesse mais recente trabalhou como trio, tendo Thiago Nogueira como baterista convidado para a gravação. Houve algum tipo de dificuldade na hora de trabalhar a musicalidade do Malefactor com esse tipo de formação?
Lord Vlad – Nos dois primeiros discos éramos um septeto. Imagine a porra! O Malefactor foi um quarteto no início, durante quase dois anos. Depois mudamos de formação e quantidade de músicos por várias vezes. Voltar ao som mais cru e direto foi um desafio, mas a gente ouve mais banda que não tem teclado, do que banda com teclado. (risos) Tivemos que passar a usar ‘sampler’ nos shows e nos discos, mas o som realmente agora é mais sujo e pesado. Meu baixo tem bastante distorção no disco e ao vivo para suprir a ‘gordura’ que havia antes com o teclado e que, certa forma, sacrifica a ‘sujeira’ das guitarras.
Recife Metal Law - Mencionei sobre dificuldades, porém a musicalidade da banda está cada vez mais apurada. Houve uma evolução, mas nunca deixando de lado suas características primordiais. Assim sendo, a música do Malefactor traz características bem próprias. Há algum cuidado para que a música da banda não saia daquela linha que a tornou conhecida?
Lord Vlad – Obrigado pelas suas palavras! Temos gostos bastante variados e a maioria das músicas são compostas inicialmente pelo Danilo. Quando a música é maior parte minha ou maior parte do Jafet dá para notar mais facilmente os estilos de composição. Só que sempre assinávamos as músicas como se fossem de todos, talvez isso mude agora que somos apenas quatro.
Recife Metal Law - “Sixth Legion” contém dez músicas, totalizando aproximadamente 60 minutos, ou seja, uma média de quase seis minutos por música. Mesmo longas, as músicas não se repetem e cada uma delas traz sua própria identidade. Como foi a forma de compor esse disco e quem foi o principal criador das músicas?
Lord Vlad – Os esqueletos iniciais das músicas foram seis do Danilo, duas do Jafet e uma minha, sendo que a décima é uma versão para a música “Down At The Valley of the Great Encounter” da antiga banda grega Horrified, uma de nossas grandes influências, com essa mescla do Black Metal com música épica. Sempre acabam todos criando arranjos durante o processo, mas quando um apresenta uma nova música, ela já está 70% pronta.
Recife Metal Law - Depois de muitas audições, cheguei a conclusão que esse disco é tipo uma coletânea de excelentes músicas do Malefactor, as quais não deixarão aqueles que acompanham a banda decepcionados. “Counting the Corpses”, “Stygian”, “The Styx River”, são alguns exemplos. Mas quais músicas vocês indicam como aquelas que representam o que é o Malefactor hoje?
Lord Vlad – O Malefactor é a mesma entidade maligna da época das Demos; a mesma veia épica da época do “Celebrate Thy War”. E todos os discos, mesmo que com algo um pouco diferente, sempre seguiram esta mesma trilha. Mas tínhamos perdido muita velocidade e usávamos muitos teclados. Isso mudou realmente. Já temos duas músicas novas feitas pelo Danilo, e o ‘cabra’ está endiabrado. Porradaria total, com algumas partes com aquelas melodias que só quem ouve Running Wild, Iron Maiden antigo, Septic Flesh, Horrified, Rotting Christ, pode entender a viagem. Nunca faremos um disco todo Death Metal ou todo Heavy Metal. Já rolaram propostas assim e sempre recusamos. A magia dessa banda é não soar monótona ou cópia de si mesma.
Recife Metal Law - Recentemente “Sodom and Gomorrah” ganhou um videoclipe, muito bem produzido, por sinal. Qual a razão para que essa música fosse a escolhida para virar videoclipe?
Lord Vlad – Porque é uma das melhores músicas que o Danilo fez na vida! (risos) Quando ele mostrou, ele estava meio receoso, porque ele tem um projeto (Divine Pain) de Death Metal, e esta música parecia mais adequada ao projeto. Mas, como ele mesmo disse, nós somos pioneiros nesta mescla de Death/Black Metal com passagens épicas no Brasil, mas viemos do ‘old school’ Death Metal... Não temos que pedir permissão ao sindicato. Nunca deixamos de ouvir, tocar ou consumir Death Metal. E ela é uma música MUITO fudida de Death Metal brasileiro. Eu ouço discos atuais de grandes bandas de Death Metal, e sem modéstia alguma, muitas não me passam a energia e rifferama de outros tempos. Ouçam “Sodom and Gomorrah” e digam que estou exagerando. Ela arranca seu pescoço! É a hora do povo mais calmo sair da frente do palco. Quando eu a anuncio nos shows, eu percebo que é a hora de a energia explodir. Espero que no nosso show no Abril Pro Rock tenhamos essa resposta do público. Ou eu mesmo desço e levo o caos. É a nossa resposta à esse fanatismo cristão imbecil dentro e fora de nosso país que prega um deus assassino e vingativo como expressão do amor. Amor é liberdade! Hail Satan! Jeovah hates YOU AND ME!
Recife Metal Law - Como já mencionado, o disco traz uma versão da banda para a música “Down at the Valley of the Great Encounter” da banda grega Horrified. De quem foi a ideia de ter essa música no ‘track list’ regular do álbum e por que justamente essa música foi a escolhida para ter uma releitura do Malefactor?
Lord Vlad – Porque essa foi a música que mudou nossa cabeça. Eles apareceram com esta mescla de Bathory, música clássica e aquelas melodias gregas que moldaram boa parte do Black Metal da década de 90. Sou fanático por Metal grego. Varathron, Thou Art Lord, Zemial, Rotting Christ, Septic Flesh, Deviser, Necromantia, Elysian Fields, Nergal, Order of the Ebon Hand, Kawir, e o novato Katavasia... Mas o primeiro álbum do Horrified é o meu preferido. Acabei ficando amigo dos caras desde a década de 90. O Gore, vocalista deles, iria cantar comigo, mas está bastante afastado da banda, e hoje trabalha com cinema nos Estados Unidos e Europa. Ele me disse que não tem mais cordas vocais para fazer gutural. Mandei a gravação e ele pirou. O disco acabou saindo na Grécia muito por causa dessa música, e alguns fanzines gregos resenharam o disco e não acreditaram que uma banda brasileira idolatrava e gravou uma faixa dessa banda obscura para a maioria da cena Metálica mundial. Ave HORRIFIED!
Recife Metal Law - Já “The Humanist” teve sua letra retirada do filme “Devil’s Advocate” (no Brasil “Advogado do Diabo”, com Al Pacino e Keanu Reeves). O que levou a banda a musicar esse monólogo retirado do filme?
Lord Vlad – Eu acho aquele filme ‘ok’. Não é um clássico, mas a cena de Lúcifer falando sobre Deus e seu egoísmo para com os humanos é linda. Aquilo é crítica à moral cristã em forma de poesia. E é o Al Pacino, né? O filho do Don Corleone que voltou como Diabo. (risos) Parece lorota, mas a música veio à mim instrumental, sem nenhum pedido anterior para encaixar com a letra. Quando fui tentando encaixar, as frases foram se moldando perfeitamente dentro da métrica, mesmo sendo um monólogo aberto, não um poema com suas linhas dentro de um padrão. Mas ela já tinha ritmo. São as loucuras da música e a magia.
Recife Metal Law - E quais foram as principais influências líricas para “Sixth Legion”?
Lord Vlad – Como sempre, Robert E. Howard, o pai do Conan e do Rei Kull, História antiga e medieval, e organizações pré-cristãs. O resto é fumaça e álcool.
Recife Metal Law - Ano passado o Malefactor disponibilizou, no YouTube, o documentário “Sob a Lei da Espada”, que marca os 25 anos da banda e traz a sua história sendo contada por músicos e ex-músicos. Vocês chegaram a cogitar o lançamento desse documentário em DVD?
Lord Vlad – O selo português que lançou o “Sixth Legion” me disse ter interesse em lançar, sim. Minha ideia é lançar junto com o relançamento do “Anvil of Crom”. Por sinal, meu amigo João, o “Portuga Metalizado”, mora hoje em Recife e estaremos com ele tomando muita cerveja no Abril Pro Rock. É bom que já vou negociar com ele bêbado. Grande abraço João, obrigado por tudo! É o segundo João em Recife que aposta no Malefactor, e o terceiro João entre as pessoas mais importantes nos nossos discos. O primeiro é o João da Maniac Records, que apostou muito no Malefactor no passado, e a quem temos a maior honra de chamar de amigo.
Recife Metal Law - Com os meios atuais de aquisição de mídias tão difundidos e com os álbuns do Malefactor disponíveis em mídias como o Spotify, qual a visão da banda sobre a participação dos Headbangers na aquisição de seus materiais? Isso, de certa forma, chegar a gerar curiosidade e, também, alguma espécie de lucro para a banda ou era melhor, financeiramente falando, vender o material físico? (pergunta por Rosberg Rodrigues)
Lord Vlad – Cara, a gente até ganha uma ‘merrequinha’ nesses sites também. Eu tenho um selo, mas confesso que estou já sem saco. Não nasci para ir em correio toda semana. Eu fazia isso quando adolescente, mas meu tesão era - e ainda é - receber cartaz com CD, Demos, fotos, patches e zines. Eu gasto mais do que ganho lançando esses discos. A procura hoje é bem maior nos shows. Quase sempre vendo bastante discos do Malefactor e de outras bandas na estrada. Pelo correio as vendas, no meu caso, dão mais dor de cabeça do que grana. Faço porque sou idiota e amo ser e viver no Underground. (risos) Viciado em disco! Eu ouço música também, e muito, nestas plataformas, e alguns caras pagam para ter as músicas. São conscientes e apoiadores também. Então tem que ter várias versões. Ainda sonho com um LP nosso. Já tive propostas, mas acho que pensam que as pessoas só compram vinil no Underground se for Grind, Death ou Black Metal. Se fosse mais barato eu mesmo já teria lançado tudo. O Malefactor sempre vende muito bem. Basta ver quantos relançamentos nós já tivemos. Agora faltam os LPs.
Recife Metal Law - A banda estava tendo suporte de Thiago Nogueira na bateria, inclusive ele gravou a bateria no mais recente álbum, porém como anda esse posto na banda? Já foi ocupado?
Lord Vlad – Sim. Fizemos alguns shows com o Thiago, que hoje mora em São Paulo, e um show com o Márcio Jordane (Devouring, Infected Cells e outras). Depois o Daniel Falcão foi convidado e demonstrou interesse em ser efetivado. Além de ser um baterista espetacular, é nosso amigo há muitos anos. Daniel também toca no Headhunter D.C., Insaintification e Vermis Mortem. Grande Metalhead e irmão!
Recife Metal Law - Quase uma década depois a banda voltará a tocar em Pernambuco e, dessa vez, será no Abril Pro Rock. Como é poder voltar por esses lados depois de tanto tempo e poder tocar justamente nesse tradicional festival?
Lord Vlad – O lado ‘OK’ é que sempre tem muitos Metalheads de várias cidades e a estrutura muito boa. Mas festival é corrido, o ‘set’ é bem menor... Na hora de chegar no ápice, o show já acabou. Espero que pessoas que nunca nos viram apreciem o show, e os antigos, muitos não veem há 10 anos ou mais, possam reviver os shows que fizemos em Recife e cidades próximas. Vai ser insano! Preparem o pescoço! Obrigado por tudo e AVE AMON! STAY EVIL!